Revista (PDF) - Universidade do Minho
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JUSTIÇA SOCIAL E IGUALDADE DE OPORTUNIDADES 215<br />
impostos para alterar a situação económica de outros e, sobretu<strong>do</strong>,<br />
que não gostariam que a sua própria situação fosse melhorada à custa<br />
de outrém. Essa possibilidade ofenderia o seu senti<strong>do</strong> moral e diminuíria<br />
o seu respeito próprio 16 .<br />
Em conclusão: o que a nossa experiência mental procura mostrar<br />
é que existe um significativo apelo moral em ambas as concepções F<br />
e R e não, como Rawls pretende, apenas numa delas. Mas o nosso<br />
argumento não é um exercício de pura negatividade. Se, por um la<strong>do</strong>,<br />
ele exclui à partida a concepção E, por outro la<strong>do</strong> afirma o peso moral<br />
das concepções F e R.<br />
Por fim, o nosso argumento aponta para uma concepção falibilista<br />
da conceptualização da justiça social em geral e da igualdade de oportunidades<br />
em particular. Mas falibilismo não implica relativismo.<br />
Mais: o facto de que ambas as concepções F e R têm peso moral não<br />
implica que tenham igual peso moral. Porém, o nosso argumento basta<br />
para estabelecer que não é possível a vitória de uma concepção sobre<br />
a outra sem o recurso a um balanço de razões não necessariamente<br />
partilhável. Ainda que as duas concepções em apreço tenham um desigual<br />
peso moral, não existe forma de o estabelecer objectivamente e<br />
com toda a certeza.<br />
Mas que não se fique agarra<strong>do</strong> à nostalgia <strong>do</strong> tempo recente em<br />
que a filosofia moral aspirava ainda a certezas sub specie aeternitatis 17 .<br />
É agora tempo de a filosofia aban<strong>do</strong>nar a insistência no consenso<br />
racional e dar maior atenção à pluralidade das nossas concepções<br />
morais, mesmo quan<strong>do</strong> devidamente ponderadas. O dissenso sobre<br />
a igualdade de oportunidades – ou sobre qualquer outro aspecto de<br />
uma concepção de justiça social – não pode ser resolvi<strong>do</strong> por meios<br />
——————————<br />
16 Um adepto de F preferiria a utopia libertária de Nozick, tal como apresentada<br />
em Nozick (1974), apesar da possibilidade de, nessa sociedade de grandes desigualdades<br />
económicas, se poder vir a encontrar numa situação particularmente desfavorecida.<br />
Caricaturan<strong>do</strong> um pouco, podemos dizer que um adepto de F, enquanto individualista e<br />
amante <strong>do</strong> risco, consideraria uma sociedade R terrivelmente aborrecida, para além de<br />
moralmente incorrecta. Por isso, estaria pronto para trocar uma vida confortável na<br />
Dinamarca por uma vida insegura na Califórnia, ou até mesmo no Arizona.<br />
17 Apesar <strong>do</strong> título modesto da obra fundamental de Rawls – A Theory of Justice –<br />
o autor podia aí escrever: «to see our place in society from the perspective of this<br />
[original] position is to see it sub specie aeternitatis: it is to regard the human situation<br />
not only from all social but also from all temporal points of view. The perspective of eternity<br />
is not a perspective from a certain place beyond the world, nor the point of view of<br />
a transcendent being; rather it is a certain form of thought and feeling that rational<br />
persons can a<strong>do</strong>pt within the world.» (Rawls, 1971: 587).