Revista (PDF) - Universidade do Minho
Revista (PDF) - Universidade do Minho
Revista (PDF) - Universidade do Minho
Create successful ePaper yourself
Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.
PORTUGAL NA «BALANÇA DA EUROPA» 171<br />
considera o erro capital <strong>do</strong> sistema político de 1820 e transporta consigo<br />
uma dura recriminação da sua classe. Não lhe dispensa a fundamentação<br />
teórica da radicalidade humana de ser livre. O Cardeal Saraiva<br />
seguira a mesma via no reca<strong>do</strong> aos soberanos da Europa: «Um povo<br />
que não quer ser conquista<strong>do</strong>» – diz aqui Garrett – «jamais o é; um<br />
povo que determinadamente quer ser livre sempre o será» 104 . O peca<strong>do</strong><br />
da burguesia seria, sobretu<strong>do</strong>, de desleixo e de omissão. O principal<br />
sustentáculo das revoluções, o povo, não fora activa<strong>do</strong> na sua vontade<br />
nem pela compreensão da mudança nem pelos seus benefícios.<br />
Por isso, e de novo,<br />
«A massa da população, inerte, impassível, indiferente, estava à disposição<br />
<strong>do</strong> primeiro que dela se quisesse valer dan<strong>do</strong>-lhe movimento<br />
em qualquer senti<strong>do</strong>: a revolução não se aproveitou dela, fê-lo a contrarevolução»<br />
105 .<br />
Garrett admite a revolução e a guerra como um ingrediente da<br />
evolução das sociedades. É um impulso natural que leva o povo a<br />
sair <strong>do</strong>s seus justos limites na rejeição da injustiça, da ilegalidade e<br />
da opressão. O seu O dia vinte e quatro de Agosto serviu para justificar<br />
o cumprimento desse impulso em Portugal, não sen<strong>do</strong> outra coisa<br />
a guerra da independência da América que, por isso, não deixou<br />
remorsos, nem tinha que deixar, aos seus executantes. Aliás, à verdadeira<br />
revolução, a feita pelo povo, é inerente a violência, já que as pacíficas<br />
só o poder as pode realizar, o que é raro, como a história mostra.<br />
Não significa isto que não se deva desejar a paz, sempre apreciada por<br />
Garrett, «mas livre-nos Deus de que nos cegue esse desejo». A hierarquia<br />
de valores é clara: primeiro a liberdade, depois a paz, sen<strong>do</strong> esta<br />
situação sempre desejável na vivência e na convivência <strong>do</strong>s povos 91 .<br />
De qualquer forma, e independentemente <strong>do</strong>s processos de<br />
marcha <strong>do</strong>s povos para a liberdade, Garrett releva sistematicamente<br />
como projecto político futuro de cada nação e da humanidade, uma<br />
forma moderada de organização e governação, onde se pratique a<br />
liberdade sem sangue, a igualdade sem desavenças, a religião sem<br />
fanatismos, a realeza sem tirania, a monarquia sem despotismo, o<br />
governo popular sem demagogos. O modelo <strong>do</strong> parlamentarismo inglês<br />
exerce nele primazia de apetência, por vezes mesmo de fascinação, o<br />
que não deixa de parecer surpreendente face ao mo<strong>do</strong> como noutras<br />
——————————<br />
104 PBE, p. 71.<br />
105 Ib.: 72.