Revista (PDF) - Universidade do Minho

PORTUGAL NA «BALANÇA DA EUROPA» 157
e dispensou a cultura das ciências; enfim, a fórmula simples que cedo
Dumouriez consagrou, tem aqui sentido: «…nada infelizmente está
mais limitado em Portugal que as letras e as artes e os meios de nelas
fazer progresso» 58 .
Nesta confrangedora panorâmica, não deixaram, todavia, de ser
notadas algumas bibliotecas, quantitativa e por vezes qualitativamente
recheadas, de alguns conventos. Ruders e Link, por exemplo, referemnos
várias. Encontramos, inclusivamente, referências a importantes
alfobres de livros particulares de nobres, clérigos ou outros, ainda que
nalgumas nem sempre os livros cumprissem o seu fim. Jácome Ratton,
por exemplo, ironizou com os 11.000 volumes que compunham a
luxuosa biblioteca do Cardeal da Cunha, através da expressão com
que os costumava denominar o ilustrado Conde da Ponte, por aquele
Cardeal os conservar intactos: as 11.000 virgens 59 . Mas Bourgoing fará
o mesmo reconhecimento daquelas excepções com indicação de diversos
casos 60 , não deixando de ter também significado, pese embora
a carga do tempo em que a observação foi feita, 1772, os sinais de
mudança que Caraccioli reconheceu por cá, e que já referimos, a favor
da ilustração, embora depois de lastimar o generalizado espírito
escolástico e consequente desprezo pelo novo 61 . No mesmo sentido,
H. Ranque, além de se congratular com a diminuição de conventos,
dilui a indigência geral, que claramente reconhece, com alguns nomes
sonantes ligados à Academia das Ciências. Enfim, excepções sobretudo
para sustentação de esperança na viragem!
Este déficit generalizado das letras, das artes e das ciências, os
contrapostos excessos, as decorrentes situações civilizacionais, foi o
que sobretudo deu substância às memórias destes verdadeiros e/ou
falsos viajantes. Afinal, foi um quadro que se repetiu na pena de quase
todos, sem grandes modificações, até ao vintismo, sendo fácil de adivinhar
as suas marcas profundas na opinião europeia. Outros vectores
descritos, no entanto, potenciaram a degradante imagem. Das muitas
páginas escritas, aludiremos apenas às que deram mais repetido eco,
ou cuja intensidade e pertinência temática o justifique:
——————————
58
DUMOURIEZ, op. cit.: 212.
59
RATTON, Jacome, ib.: 166.
60 Ver, do autor, op. cit., II vol.: 85/86.
61
CARACCIOLI, Voyage de la raison en Europe, Compiègne, Chez Louis Bertrand e
Paris, Chez Saillant et Nyon, 1772