Revista (PDF) - Universidade do Minho
Revista (PDF) - Universidade do Minho
Revista (PDF) - Universidade do Minho
You also want an ePaper? Increase the reach of your titles
YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.
FILOSOFIA DA EUROPA: QUESTÕES SOBRE A EUROPA 51<br />
representa, então, uma tomada de consciência de decadência das formas<br />
sociais impositivas, significan<strong>do</strong> a desvalorização moderna de<br />
valores morais e sociais assimila<strong>do</strong>s.<br />
A sua «perspectiva» gera perspectivas, conforme proclama: «O que<br />
eu conto, é a história <strong>do</strong>s <strong>do</strong>is próximos séculos. Eu descrevo o que<br />
virá, o que não pode deixar de chegar: o advento <strong>do</strong> niilismo. Esta<br />
história pode ser desde agora contada, porque a própria necessidade<br />
está em actividade. Esse futuro fala já por cem signos, esse destino<br />
anuncia-se por to<strong>do</strong> o la<strong>do</strong>; todas as orelhas estão já estendidas para<br />
essa música futura. Toda a nossa civilização europeia se move desde há<br />
muito já numa espera torturante que crê de lustro em lustro e que<br />
conduz a uma catástrofe; inquieta, violenta, precipitada, ela é um rio<br />
que quer chegar ao seu termo, ela não reflecte mais, ela receia reflectir»<br />
103 . Assim, perscruta a humanidade ocidental em devir.<br />
Por to<strong>do</strong> o la<strong>do</strong> Nietzsche divisa sinais de declínio <strong>do</strong> Europeu,<br />
qual «animal <strong>do</strong>ente, <strong>do</strong>entio, enfermo», que esconde os seus males<br />
sob as vestes da moral. Com a tentativa defraudada <strong>do</strong> wagnerismo, o<br />
tema <strong>do</strong> «bom Europeu» mostra-se como profeta <strong>do</strong> futuro: quer-se<br />
um «bom europeu, isto é, um «sem pátria», numa Europa em que as<br />
nacionalidades se desvanecem. Como as políticas nacionais, as línguas<br />
nacionais dissimulam o processo de extinção <strong>do</strong> espírito nacional.<br />
Perscrutan<strong>do</strong> um género de «dionisismo político», afirma: «Chame-se<br />
«civilização», «humanização» ou «progresso» ao que distingue<br />
hoje os europeus; chame-se isso simplesmente, sem louvor ou calúnia,<br />
com uma fórmula política, o movimento democrático da Europa; subjacente<br />
a to<strong>do</strong>s os planos políticos e morais, designa<strong>do</strong>s por uma tal<br />
fórmula, realiza-se um enorme processo fisiológico, que se intensifica<br />
em cada dia: os Europeus assemelham-se sempre mais, emancipam-se<br />
cada vez mais das condições que fazem nascer raças ligadas pelo clima<br />
e costumes, libertam-se em cada dia mais de qualquer meio determina<strong>do</strong>,<br />
gera<strong>do</strong>r de necessidades idênticas, para a alma e o corpo, no<br />
decurso <strong>do</strong>s séculos; eles fazem surgir pouco a pouco um tipo de<br />
humanidade essencialmente supranacional e nómada que, para utilizar<br />
um termo da fisiologia, possui no mais alto grau e como sinal<br />
distintivo o <strong>do</strong>m e o poder de se adaptar». E mais adiante: «Graças às<br />
divisões mórbidas que o devaneio nacionalista provocou, e ainda provoca<br />
entre os povos da Europa, aos políticos de vistas curtas e de<br />
——————————<br />
103 Friedrich Nietzsche, La volonté de puissance, texto estabeleci<strong>do</strong> por F. Würzbach,<br />
tr. de G. Bianquis, t. II, Paris, Gallimard, §. 25, p. 23.