Revista (PDF) - Universidade do Minho
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FILOSOFIA DA EUROPA: QUESTÕES SOBRE A EUROPA 71<br />
europeu. Para Rougemont, «a liberdade realiza-se e actualiza-se na<br />
responsabilidade». Esta ligação fundamental e indissolúvel da liberdade<br />
e da responsabilidade é o traço característico <strong>do</strong> civismo europeu.<br />
Ela representa a saúde da democracia, cujos duas <strong>do</strong>enças típicas<br />
são o individualismo assaz competitivo e o colectivismo estatal; no<br />
primeiro caso, o homem não é responsável, no segun<strong>do</strong>, não é livre;<br />
nem no primeiro nem no segun<strong>do</strong> <strong>do</strong>s casos poderá ser considera<strong>do</strong><br />
um verdadeiro cidadão 151 . Ora, o civismo europeu não poderá<br />
consistir numa mera imitação das regras comuns (isto é, uma «instrução<br />
cívica» no senti<strong>do</strong> tradicional), mas num treinamento <strong>do</strong> espírito<br />
crítico, em ordem à iniciativa pessoal 152 . «A pessoa humana, é o<br />
homem considera<strong>do</strong> na sua dupla realidade de indivíduo distinto e de<br />
cidadão empenha<strong>do</strong> na sociedade. Provi<strong>do</strong> de liberdade e de responsabilidade,<br />
solitário e solidário (segun<strong>do</strong> a expressão de Victor Hugo,<br />
retomada por Camus), distinto <strong>do</strong> rebanho por essa mesma vocação<br />
cujo exercício o religa à comunidade, esse homem constitui-se na<br />
dialéctica <strong>do</strong>s contrários. E esta característica vai transmitir-se a to<strong>do</strong>s<br />
os grupos que ele formará com outros homens, seus semelhantes.<br />
Estes grupos deverão ser, por sua vez, simultaneamente autónomos e<br />
solidários: para eles também, um não irá sem o outro; muito melhor:<br />
um – a solidariedade – será a garantia <strong>do</strong> outro – a autonomia» 153 .<br />
O civismo europeu é, pois, a aprendizagem da liberdade na responsabilidade;<br />
é uma atitude que conduz à formação dum espírito de iniciativa<br />
pelo qual o cidadão se realizará como pessoa.<br />
Na cultura europeia verifica-se também uma tensão original – e<br />
fecunda –, entre sagra<strong>do</strong> e profano. «Entre todas as culturas que<br />
fizeram a história da humanidade, apenas Europa ousou a aventura<br />
dum desenvolvimento autónomo das ciências e das artes, entre o<br />
sagra<strong>do</strong> e o profano, entre a coerência global definida pela teologia<br />
——————————<br />
151 Cf. Denis de Rougemont, «Civisme et Culture», in: Bulletin du Centre Européen<br />
de la Culture, Genève, Maio 1967, p. 4.<br />
152 Afirma nomeadamente: «Initiation et iniciative sont en fait deux tendances<br />
contradictoires, puisque par la première on veut rendre l’élève absolument conforme<br />
au type social em vigueur, et par la seconde, on veut essayer de l’en libérer. Dans l’idéal<br />
de l’éducation européenne, ces deux tendances antinomiques <strong>do</strong>ivent être combinés.<br />
On ne peut pas exclure l’une au profit de l’autre. Il y a un optimum à trouver entre<br />
ces deux maxima contradictoires. C’est ce que j’appelle la règle d’or de l’éducation<br />
européenne: conduire l’élève à l’autonomie personnelle après lui avoir fait acquérir tout<br />
ce que l’on peut par les moyens de l’initiation, le conduire à trouver sa vocation personnelle<br />
originale, et à exercer ensuite dans la communauté». Denis de Rougemont, Inédits,<br />
op. cit., p. 50.