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Baixar - Proppi - UFF

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Sebastián era um dos promotores mais próximos e confiáveis do então Fiscal General,<br />

motivo pelo qual era citado a reuniões com “o chefão”, como às vezes, o chamava.<br />

Sebastián tinha vivido toda sua vida na zona sul do conurbano. Até mais de<br />

quinze anos atrás, em uma das localidades consideradas melhor acomodadas dessa área.<br />

Depois, mudou-se para um sítio em um município mais afastado. Reivindicava com<br />

freqüência o fato de morar “fora da cidade”. Toda sua formação tinha sido no seio de<br />

uma família católica. Lembrava com freqüência de sua adolescência quando fazia<br />

trabalho voluntário em favelas, em um grupo de jovens vinculado à linha<br />

“terceiromundista” da Igreja Católica. Ingressar no Judiciário era, para ele, uma forma<br />

de continuar ‘fazendo’ alguma coisa pelos outros e de estar em contato com as pessoas.<br />

A visão de Sebastián e de Diego sobre a academia e a antropologia remetia,<br />

nesse contexto, a uma oposição entre fazer e observar, que, aos poucos, foi cedendo<br />

pelo interesse de ambos nas “impressões que você tem sobre nós”. Lembro que, na<br />

primeira visita, quando finalmente combinei com Valeria e Sebastián que poderia<br />

começar minhas idas mais sistemáticas à UFI, Sebastián lembrou: “nós já estamos<br />

acostumados, já fomos objetos de observação de um... psiquiatra!”. E concluiu:<br />

Sebastián: Deve ter feito um relatório de que todos nós estávamos malucos.<br />

Valeria: é que para aquele que vem de fora, a gente deve estar maluco mesmo.<br />

S: no outro dia estava o marido de uma funcionária e eu atendi uma ligação pelo<br />

suicídio de uma senhora que tinha se enforcado. E aí no meio da ligação grito: “e<br />

a velha está pendurada ainda?!”.<br />

Na rotina da UFI, a linguagem jurídica cedia amplamente o lugar a um linguajar<br />

corriqueiro, mas carregado da naturalização de situações vinculadas a experiências não<br />

comuns à média da população (estar preso, ver corpos mortos, saber de armas). Quando<br />

viajava de carro com Valeria, por exemplo, mais de uma vez ela dizia “ah, aqui vim<br />

com Alicia no homicídio de um cara morto com uma caneta na jugular”, ou bem<br />

localizava um lugar no mapa no mesmo sentido: “lembra onde a gente foi naquele<br />

homicídio, bem aí”. No caso de Sebastián, essa forma de falar também marcava a ênfase<br />

em um estilo de quem conhece o terreno. Ou, como me disse um policial que em muitos<br />

casos trabalhava com eles, “o Dr. Vázquez tem estrada” [“tiene calle”]. Imprimir à sua<br />

forma de desenvolver o trabalho esse tom informal, menos jurídico e mais executivo,<br />

fazia parte de seu estilo e, portanto, de uma forma de diferenciação com outros.<br />

“Popular, peronista e republicano”, gostava de se autorepresentar.<br />

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