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Baixar - Proppi - UFF

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falava” foram se construindo as linhas de investigação que conduziram aos sucessivos<br />

“suspeitos” até chegar a Cacá. Por esse caminho, este foi definido como o “único<br />

acusado” e, finalmente, condenado como o “autor”.<br />

Apesar de suas variadas formas de exposição e transmissão, os diversos<br />

testemunhos mostraram que as informações aportadas pelo “bairro” estavam baseadas<br />

nos laços sociais que uniam e/ou distanciavam as pessoas naqueles territórios limitados.<br />

Um vínculo de parentesco (“o genro do Sopa”, “o namorado de Samanta”), um local de<br />

moradia (“na rua Belgrano e San Juan”, “o conheço do fundo”), um hábito de<br />

sociabilidade (“que param na esquina”, “é um bardero”), eram aspectos que resultavam<br />

da vida partilhada no “bairro”. Sobre eles eram extraídos os dados aportados. Assim,<br />

essas informações atuavam também como atribuidoras de identidade, pudendo incluir<br />

uma pessoa dentro do “bairro”, ou bem a excluindo dele.<br />

Foi também a partir do conhecimento da vida do “bairro” que se teceram as<br />

informações na investigação sobre a responsabilidade de Marisa e Carlos na morte de<br />

seu filho Rodrigo e no estado grave de saúde de Sabrina. Também nesse episódio o<br />

“bairro” teve um papel significativo na investigação dos “fatos”. Diferentemente, este<br />

caso não envolvia a identificação de “suspeitos” ou de “autores” dos “crimes”<br />

investigados. Tratava-se de estabelecer, em tal caso, a responsabilidade judicial e<br />

criminal de Marisa e Carlos como “responsáveis naturais” do cuidado, criação,<br />

alimentação e educação de seus filhos. Identificar se ambos tinham ou não faltado a<br />

suas obrigações parentais foi o eixo da investigação judicial. Para isso, foi necessário<br />

reunir um conjunto de informações que permitissem considerar como eles tinham se<br />

comportado a esse respeito. Como descrevi no Capítulo 6, os depoimentos de<br />

familiares, vizinhos e profissionais que atenderam a família levaram ao âmbito judicial<br />

percepções e opiniões sobre o que essas pessoas observavam sobre a rotina na casa de<br />

Marisa e Carlos. Permanentemente, essas informações foram conduzidas através do<br />

apelo à categoria do “bairro”. Este – “por que o bairro fala”, disse Marisa para Valeriaera<br />

personalizado como uma figura que, embora anônima e geral, “sabia” sobre aspectos<br />

diversos da vida doméstica e familiar do casal.<br />

Neste caso, a situação investigada e julgada envolveu, nos termos de Baudouin<br />

Dupret, “o tratamento judicial de questões morais”. Esta característica evidenciou, de<br />

forma explícita, não só como as testemunhas operavam, falavam e informavam a partir<br />

dos valores morais que tinham disponíveis, mas também como os agentes judiciais<br />

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