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Moralidades, direito e conflitos<br />

Lawrence Rosen inicia o prefácio de “The anthropology of justice. Law as<br />

culture in Islamic society” (1989) chamando a atenção para o fato de, apesar dos pontos<br />

de coincidência entre eles, antropologia e direito não terem contribuído um para outro<br />

como poderiam tê-lo feito. De parte dos antropólogos, porque estes têm priorizado o<br />

funcionamento dos tribunais como um domínio particular cuja linguagem, regras e<br />

procedimentos atípicos, de certo modo, o distanciam do cenário da vida social, ou bem<br />

como um campo arcano cuja rigidez institucional faz perder sua capacidade de resolver<br />

disputas sem alienar amplos segmentos sociais. Diante dessas tendências, Rosen propõe<br />

uma análise do direito como sendo “parte da cultura mais ampla, um sistema que, apesar<br />

de sua própria história institucional e de suas formas distintivas, partilha de conceitos<br />

que se estendem em vários outros domínios da vida social” (1989:5). Assim, afirma,<br />

analisar o campo do direito como um fenômeno cultural não é mais atípico do que ver<br />

aspectos de uma sociedade através do comportamento de seus membros no mercado<br />

público, na moradia familiar ou nas casas de culto. Tal aproximação do direito supõe,<br />

então, se aproximar a ele tal como os antropólogos têm conduzido, geralmente, suas<br />

pesquisas: como uma busca dos conceitos através dos quais uma comunidade categoriza<br />

e agrupa sua experiência em grupos de significado simbolicamente apreendido e<br />

manipulado, ao tempo em que vai organizando suas relações cotidianas (1989:5) 7 .<br />

Estas considerações iniciais de Lawrence Rosen anunciam sua etnografia sobre o<br />

direito islâmico no Marrocos, em particular, sobre a figura do qadi (juiz islâmico) e<br />

sobre os mecanismos através dos quais o qadi decide conforme “um leque de<br />

pressupostos culturais que faz suas decisões compreensíveis para a sociedade em que<br />

age” (1980-1:218). Antes de se adentrar nessa etnografia, Rosen descreve seu primeiro e<br />

único dia na corte americana, como protagonista, junto com seus vizinhos, de uma ação<br />

oposição (irracional / racional), mas ambos são expressão dos sentidos experimentados na ação humana.<br />

Nesse sentido, valores e interesses como aqui entendidos revelam, como sugere Albert Hirschman, “um<br />

elemento de reflexão e cálculo com respeito à maneira pela qual buscar atingir essas aspirações humanas”<br />

(1979: 37).<br />

7 No ensaio “O saber local: fatos e leis em uma perspectiva comparativa”, Clifford Geertz ressalta o<br />

trabalho de Lawrence Rose (também de Sally Folk Moore) e, em um sentido semelhante, explora os<br />

encontros e desencontros entre a antropologia e o direito. Nesse ensaio, Geertz trata da relação entre fatos<br />

e leis, propondo o conceito de “sensibilidades jurídicas” para dar conta de uma análise comparativa “das<br />

bases culturais do direito”. “Essas sensibilidades – afirma- variam, e não só em graus de definição;<br />

também no poder que exercem sobre os processos da vida social, frente a outras formas de pensar e sentir;<br />

ou nos seus estilos e conteúdos específicos. Diferem profundamente nos meios que utilizam (...) para<br />

apresentar eventos juridicamente” (2002:261-262).<br />

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