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Baixar - Proppi - UFF

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Também Dario já tinha sido objeto de detenções por parte de policiais daquela<br />

comisaría. O relacionamento conflituoso entre os jovens e a polícia foi, diante destes<br />

casos, fruto de protestos e manifestações. Também de entrevistas com o comisario<br />

responsável, o mesmo que depois, no caso de Dario, seria acusado –e condenado- por<br />

“encobrimento”.<br />

Por mais acidental que o disparo tenha sido, e em tal caso, não cabe a mim<br />

definir essa questão, os acontecimentos que posteriormente seriam convertidos em<br />

“fatos jurídicos” a serem investigados e julgados, não se davam em um vazio social. O<br />

“bairro” parecia o lugar onde as relações que lhes davam forma se manifestavam ou,<br />

pelo menos, podiam ser investigadas. O “bairro” aparecia recorrentemente como<br />

categoria nativa com diferentes significados e funções. Neste caso, aparecia marcando<br />

um limite social entre grupos (“vizinhos” / “malandros”). Mas, ao mesmo tempo,<br />

aparecia como o “bairro” em defesa de Dario, em seu pedido de “Justiça”. Este “bairro”,<br />

durante o juicio, embora pouco e nada tenha ‘falado’ formalmente nas audiências,<br />

esteve presente, com seus cartazes e bandeiras, com seus corpos no “público”, com seus<br />

comentários fora de tempo, e, paradoxalmente, através da presença policial para, talvez,<br />

conter eventuais distúrbios.<br />

Esse significado móvel do “bairro”, sustentando relações sociais diversas,<br />

também fazia oscilar, durante o julgamento, os papéis de testemunha, imputado e<br />

vítima. Embora na sala de audiência estes estivessem formalmente delimitados espacial<br />

e funcionalmente, nos discursos de advogados e testemunhas, bem como na atitude de<br />

controle do “público”, por vezes, pareciam ser intercambiáveis. O chefe de<br />

investigações disse que “encontrou Talarico, a vítima, que estava muito nervosa”; no<br />

final, foi solicitado que Talarico fosse investigado como “imputado”, policiais que não<br />

se lembravam de certas circunstâncias eram interrogados com as suspeitas próprias do<br />

interrogatório de um “imputado” (com direito a mentir); os “imputados” tinham<br />

prioridade para sair da sala antes que o “público” e circulavam por ela com maior<br />

liberdade.<br />

Nas audiências posteriores ao primeiro dia do juicio, o papel confortável da<br />

observação etnográfica me permitiu relevar muitas informações úteis para posterior<br />

análise. Sentia-me à vontade anotando no meu caderno o que via, ouvia e percebia.<br />

Contudo, sem dúvidas, a experiência de depor e me investir do papel de “testemunha”<br />

por um dia significou também um aprofundamento nas amplas possibilidades de<br />

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