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Baixar - Proppi - UFF

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espondia às obrigações morais das relações de parentesco por ele identificadas e<br />

socialmente legitimadas.<br />

Os depoimentos de Marisa e Carlos evidenciavam uma indagação pelo ocorrido<br />

no dia da morte do bebê e também pelo cuidado prévio e posterior de ambos os pais<br />

com todos os filhos. Mas, da mesma forma e intensidade, eram indagadas as condições<br />

de vida e de limpeza, de hábitos e rotinas, do casal e do âmbito doméstico em geral.<br />

Julgavam-se, assim, não só as obrigações jurídicas dos pais, mas também a “sujeira”, o<br />

“descaso”, ‘uma’ forma de vida familiar. Os “critérios de limpeza” eram,<br />

evidentemente, diferentes. Só que o contexto judicial da conversa exigia definir um<br />

deles como válido. E para isso restava tempo de investigação.<br />

No final do depoimento, já lida a ata, com o acordo de todos, Alicia explicou<br />

para Carlos que o crime pelo qual estava “imputado” não era “excarcelable”, portanto,<br />

tratava-se da possibilidade de ele ficar preso até que fosse realizado um julgamento.<br />

Logo, Carlos perguntou pela situação de Marisa e das crianças.<br />

Alicia: Marisa está igual que você e as crianças nas mãos de minoridade.<br />

Carlos: e recuperando a liberdade podemos recuperar a família completa?<br />

Alicia: isso não é administrado por nós. É decidido por um juiz de menores.<br />

Nesse momento, Carlos começou a chorar intensamente. Colocou a cabeça entre<br />

as mãos e esperou alguns longos minutos para falar. Ninguém dizia nada. Carlos disse<br />

que queria estar com seus filhos, que sua família é tudo o que ele tem.... A defensora<br />

explicou para ele que os filhos estavam bem e que estavam sendo cuidados pela exmulher<br />

dele. Carlos agradeceu a informação, dizendo que isso o deixava mais tranqüilo.<br />

“Eu parti de zero, aos 40 anos eu disse para Marisa que o único que tinha para lhe dar<br />

era trabalho”.<br />

Comentamos sobre essa situação assim que Carlos foi retirado da sala. Alicia<br />

disse que não conseguia reter a emoção de vê-lo se quebrar desse jeito. Valeria disse<br />

que não sentiu igual; que, ao pensar na imagem do bebê morto, não conseguia sentir<br />

pena nenhuma por Carlos, nem por Marisa. Não era a primeira vez, na minha presença,<br />

que alguém se emocionava e chorava na UFI. Muitas foram as vezes, naquelas<br />

situações, que vi os olhos de Valeria encher de lágrimas e se emocionar ‘junto’ com os<br />

depoentes. Desta vez, a ‘não-emoção’ marcava uma distinção de valores morais com os<br />

quais não se identificava. Pode ser argumentado que o ‘fazer justiça’ não precisa de uma<br />

empatia com as pessoas julgadas. Aplicar a lei não supõe, na nossa sociedade, de<br />

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