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Baixar - Proppi - UFF

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legal contra uma empresa pública. Dessa forma aproxima sua vasta experiência nas<br />

cortes islâmicas com sua ocasional vivência na americana. O ponto comum é o<br />

questionamento sobre quais variáveis estão envolvidas na tomada de decisões judiciais<br />

por parte de um juiz – muçulmano, ou americano. Seja qual for a resposta em cada caso,<br />

é claro, no argumento de Rosen, que tais variáveis não estão descoladas da realidade<br />

social e cultural dos atores envolvidos, de suas posições sociais e das regras sociais que<br />

regem as relações e interações sociais.<br />

Inserindo o direito no campo de outros domínios culturais, essa perspectiva<br />

permite abordar aspectos da administração de justiça por vezes escondidos atrás do<br />

esoterismo e do formalismo próprios do saber jurídico. Dessa forma, é possível<br />

reconhecer no direito, assim como na religião, no parentesco ou na política, uma<br />

dimensão moral. “Se direito e moral estão imbricados não é só porque o direito trata de<br />

questões morais, mas porque a prática do direito está impregnada de uma moralidade,<br />

tal como a atividade ordinária” (2006:78), afirma Baudouin Dupret na sua etnografia do<br />

“direito, a moral e a justiça” no Egito 8 . A linha de seu trabalho está dirigida a mostrar<br />

que toda ação judicial é também uma ação moral. E isso em dois sentidos: porque a<br />

atividade de julgar transforma questões morais em objetos de direito e porque o domínio<br />

da moralidade informa constantemente o direito e serve de base ao estabelecimento de<br />

um julgamento da normalidade (2006:438) 9 . A ação judicial, nessa perspectiva, ao se<br />

manifestar sobre questões morais e ao estar informada por valores morais, tende a fixar<br />

juridicamente uma moralidade cuja orientação não é interior aos agentes, mas orientada<br />

e situada publicamente. Nesse processo, a ação judicial estabelece e dota de definição<br />

jurídica categorias de “normalidade”, daquilo que é considerado “comum”, “usual”,<br />

8 A relação entre moral e direito também tem sido foco no campo da chamada “filosofia do direito”, tanto<br />

pela relação dos valores morais com a atividade do legislador, quanto com a administração de justiça.<br />

Essas reflexões têm dado origem a diferentes teorias sobre a conexão necessária ou contingente entre<br />

ordem moral e ordem jurídica e sobre o lugar das valorações morais, políticas ou religiosas dos juízes nas<br />

suas decisões. De forma geral, estas teorias, inclusive aquelas que reconhecem o fato do direito fazer<br />

parte de uma ordem moral, têm distinguido as normas morais das jurídicas, caracterizando as primeiras<br />

como individuais, interiores e livres e as segundas como sociais, exteriores e coativas (Borda, mimeo;<br />

Cárcova, 2009, Nino, 1980; ver também Daich, 2010:112). Como assinala Dupret, a distinção entre<br />

normas morais e normas jurídicas é um dos princípios fundamentais do direito moderno e, mesmo que<br />

autores da corrente substancialista do direito, em oposição à corrente formalista ou positivista, tenham<br />

reintroduzido a moral no campo do direito, em todas essas perspectivas resta a pergunta sobre ‘como’<br />

essa dimensão moral atua, ou intervém, no fenômeno jurídico.<br />

9 Afirma ser objetivo de sua etnografia observar e descrever: 1) a dimensão moral da atividade judiciária,<br />

no sentido de profissionais e profanos estarem engajados social e culturalmente na ação de produção de<br />

saber, e 2) o tratamento judicial de questões de moral, ao analisar, principalmente, casos judiciais<br />

relativos a questões sexuais (2006:7).<br />

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