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Baixar - Proppi - UFF

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característica central, ou única, das práticas judiciárias. Comecei perceber que ‘forma’ e<br />

‘fundo’ podiam se alternar, dependendo de certas variáveis. Uma delas era a<br />

intervenção, no processo, de diversos atores – advogados particulares ou defensores<br />

públicos, assistentes da acusação, imprensa, intervenção de associações de direitos civis<br />

e humanos. Outra, não independente da primeira, estava vinculada à “convicção” que os<br />

agentes judiciais iam formando sobre o caso. Em algumas situações, o respeito à<br />

‘forma’ ganhava tal importância que o ‘fundo’ - o conteúdo dos relatos e das decisõesperdia<br />

consistência. Mas, em outros casos, a ‘forma’ era utilizada e moldada com o<br />

único fim de que o (um) ‘fundo’ fosse aceito como válido. Ora se priorizava um, ora se<br />

priorizava o outro, tal como podia ser feito pelo observador com aquelas figuras dos<br />

desenhos em preto e branco.<br />

É verdade que em todos os casos, o respeito à ‘forma’ era importante. Assim o<br />

era porque o uso correto das ‘formas’ processuais garantia a validade jurídica de tudo<br />

aquilo que se fizesse ou dissesse no âmbito de um processo judicial. O que quero<br />

marcar é que ela nem sempre era priorizada independentemente do conteúdo dos relatos<br />

e das informações levadas ao âmbito judicial. A ‘forma’ não se mostrava, assim, como<br />

algo neutro, descontextualizado e despersonalizado. Não era apenas um molde onde<br />

encaixar as informações judiciais, mas parte de disputas ideológicas e políticas sobre<br />

como pensar e fazer funcionar o sistema judicial 3 . Por exemplo, o uso de uma categoria<br />

e não de outra marcava posicionamentos e identidades no campo jurídico. Não tinha a<br />

mesma ressonância falar em “indagatória” do que em “declaração do imputado”. Tal<br />

mudança de categorias tinha sido estabelecida com a reforma do Código de Processo<br />

Penal da província de Buenos Aires (CPP-PBA) em 1998 e o uso de uma ou outra<br />

categoria, entre outras, definia entre os funcionários uma maior ou menor adesão à<br />

reforma.<br />

Ao mesmo tempo, a ‘forma’ era uma ferramenta para validar juridicamente as<br />

decisões tomadas nos casos concretos. Como enfatizarei ao longo da tese, a ‘forma’<br />

podia estar ao serviço do ‘fundo’, sendo utilizadas diferentes estratégias de adaptação<br />

das ‘formas’ para dar conta desse objetivo. O conhecimento sobre os usos possíveis da<br />

3 Baudouin Dupret, cuja etnografia sobre os tribunais no Egito retomo mais adiante, assinala: “A<br />

afirmação de que o procedimento é importante em direito pode parecer trivial (...). Mas os<br />

constrangimentos procedimentais não se correspondem com um ensamble de regras abstratas extraídas de<br />

um sistema jurídico exterior, mas com a performance rotineira e burocrática dos profissionais do direito”<br />

(2006:164). Nesse sentido, propõe tratar os procedimentos, não como regras, mas como práticas.<br />

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