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Baixar - Proppi - UFF

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Então, mais um homicídio que Cacá não foi. Então, cuidado, o ilícito cometido é<br />

aberrante, mas acho que tanto os familiares como a justiça têm que buscar a<br />

vítima [trata-se de um erro ou lapsus, pois deveria dizer “imputado”] que<br />

realmente foi (...) Pergunto-me, se no momento do fato, em um bairro onde<br />

todos se conhecem, onde todos se vêm, onde todos sabem quem é quem, por<br />

mais bloqueio, flash, insight, ou seja o que for, como não identificar no<br />

momento “foi Fulano”... mas não [sic]. Começamos com Jesus, depois com<br />

Topo que termina sendo autor e preso por outro homicídio, até chegar a Cacá.<br />

(Da alegação do advogado de Cacá)<br />

Seja porque andava pela área, seja porque sua namorada morava perto, ou<br />

porque, afinal, ele mesmo não morava há tantas quadras de distância do “bairro”, o fato<br />

de Cacá ser conhecido no “bairro” era o principal argumento do advogado para<br />

justificar o “erro” ou “confusão” quanto a ter sido ele o autor do “homicídio”. Dessa<br />

forma, inscrevia Cacá no “bairro” do local do fato, enquanto o “bairro”, os vizinhos e<br />

familiares das vítimas – Quique e Santiago-, distanciavam-se dele, como uma pessoa<br />

que “não era do bairro”, embora andasse no bairro, aprontasse no bairro.<br />

Promotor: a senhora conhecia Cacá?<br />

Dona do quiosque: sim, por um familiar, por isso eu dizia que era o genro de<br />

Sopa.<br />

Promotor: onde mora Sopa?<br />

Dona do quiosque: na esquina da minha casa.<br />

Promotor: iam ao seu comércio?<br />

Dona do quiosque: não, ocasionalmente. Era gente nova. Vinham de outro<br />

bairro; diziam que era da torcida [em referência aos comentários sobre Sopa ser<br />

da torcida organizada de um clube de futebol da área].<br />

Em contraste, o argumento do advogado se baseava na proximidade geográfica -<br />

tudo era em um raio de quinze quadras- como fundamentação de um conhecimento<br />

pessoalizado e uma interação permanente. Se “todos se conhecem” e “todos se vêem”,<br />

era possível supor que Cacá fora identificado pela polícia e pelas testemunhas, seja por<br />

preconceito – estava sendo investigado pela polícia em outro homicídio-, seja mesmo<br />

por uma “confusão”. A fronteira social bem delimitada pelo “bairro” na sua comunidade<br />

de pertencimento era transpassada pelo argumento do advogado. Não importava se Cacá<br />

tinha “um bom ou mau conceito”, a questão era que ‘alguma’ reputação tinha e que a<br />

mesma o transformava em possível “autor”, embora não fosse, segundo a alegação do<br />

advogado, o autor “real”.<br />

Lembrei da frase de Sebastián sobre o dia da “reconstituição do fato”: “a família<br />

queria um preso; nós queríamos o autor preso”. A diferença era, neste momento,<br />

essencial no argumento do advogado. O fato tinha sido “aberrante”. Era necessário, na<br />

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