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Baixar - Proppi - UFF

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apenas morde os descalços”. E ficaram como loucos e saíram xingando. Eu disse<br />

isso tudo por conta de um artigo de [Eduardo] Galeano que saiu no jornal que<br />

fala de “Justo, a Justiça”. Claro, tiveram que absolver porque não havia nada,<br />

mas absolveram zangados, muito zangados. (Entrevista com defensora oficial,<br />

29/05/09)<br />

O relato da defensora ressaltou para mim quão mau visto podia ser o fato de<br />

trazer à tona, no juicio, citações de romances, matérias de jornais ou frases de famosos.<br />

Também berrar e gritar não eram atitudes bem quistas no âmbito daquelas audiências.<br />

Em outras, já tinha percebido o incômodo dos juízes, quando algum dos funcionários<br />

inclinava-se por comentários, ou referências por fora daquelas da jurisprudência ou da<br />

doutrina jurídica. Basta lembrar aqui a ênfase do presidente do tribunal, no juicio de<br />

Dario, com a “economia de tempo” do julgamento quando vislumbrava “digressões”<br />

possíveis sobre o “objeto do processo”. Em um daqueles cortes, o presidente, como<br />

narrado, chegou a informar que até ele mesmo tinha apresentado, em um congresso, um<br />

trabalho sobre a temática discutida – o lugar da “vítima” no processo. Não se tratava de<br />

achar o assunto pouco relevante. A questão parecia ser o âmbito: ela podia ser discutida<br />

e trabalhada em eventos acadêmicos, mas a audiência de juicio não era ambiente<br />

adequado para discorrer sobre debates ou argumentos que fugissem dos “fatos”.<br />

Na visão e na prática destes agentes, o juicio oral parecia requerer de uma<br />

solenidade formal, técnica, que, inclusive, reproduzisse o quanto possível não só aquilo<br />

já escrito no processo, mas também a lógica da escrita judicial: sem gestos, sem<br />

alterações do tom de voz, sem debates acalorados, sem “parênteses”. Tal atitude que,<br />

interpreto eu, parecia ser exigida aos funcionários no seu desempenho oral contrastava,<br />

por um lado, com o processo através do qual, na etapa de instrução, os agentes<br />

chegavam àquilo que ficava registrado por escrito e, por outro lado, com o<br />

comportamento permitido às testemunhas nas audiências.<br />

Como descrevi nos outros capítulos, o desenvolvimento da investigação na<br />

primeira etapa do processo tinha um caráter dinâmico e informal. Isto é, a descrição dos<br />

“fatos” e os depoimentos e “provas” sobre eles iam se construindo na medida em que o<br />

processo avançava, as informações se contradiziam ou confirmavam e o mesmo se<br />

tornava verossímil ou convincente aos olhos dos funcionários da UFI. Nesse decorrer,<br />

estes expunham sua intuição e sentidos, ironizavam ou se emocionavam junto com os<br />

depoentes, trocavam histórias, olhavam fotos familiares. Os formalismos, no sentido da<br />

repetição de fórmulas jurídicas que dessem forma aos procedimentos – como a<br />

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