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Baixar - Proppi - UFF

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são identificadas outras funções que a fofoca pode adotar na vida social de um grupo.<br />

Na sua etnografia de bairros populares em Porto Alegre, Claudia Fonseca associa a<br />

fofoca com uma função educativa, bem como com um meio para informar sobre a<br />

reputação dos moradores de um local, “consolidando ou prejudicando sua imagem<br />

pública” (2004:42). Pode ser, portanto, um instrumento de ataque quando se dá entre<br />

iguais, bem como de proteção e manipulação, quando utilizado contra os mais fortes<br />

(2004:48). Em um sentido semelhante, Elias e Scotson identificavam a fofoca, além de<br />

sua função integradora, como um elemento de “rejeição de extrema eficácia”<br />

(2000:125); podia ser “tanto uma arma de defesa quanto de ataque” (2000:132). Ao<br />

mesmo tempo em que reforçava o carisma do próprio grupo, se afirmava sobre a<br />

desonra do grupo alheio (2000:133). Nessa linha de argumentação, Elias e Scotson, ao<br />

tempo que distinguem entre “fofocas de apoio e elogiosas” e “de rejeição e censura”,<br />

afirmam as primeiras serem inseparáveis das segundas.<br />

“As notícias sobre o desrespeito às normas aceitas, cometido por pessoas<br />

conhecidas da comunidade, eram muito mais saborosas, forneciam maior<br />

entretenimento e uma satisfação mais prazerosa do que os boatos sobre alguém<br />

que fosse digno de elogios por defender os padrões aceitos, ou merecedor de<br />

apoio em um momento de necessidade” (2000:124).<br />

As fofocas que circulavam em torno à vida de Marisa e Carlos pareciam-me ter<br />

este duplo papel. Se, através delas, eram criticados e rejeitados os modos de organização<br />

doméstica e familiar de Marisa e Carlos, era porque também se enfatizava e defendia<br />

um modelo de família distinto. Esse modelo era afirmado e elogiado através dos<br />

comentários censuradores sobre o comportamento do casal e seu suposto desrespeito às<br />

normas comuns. Aqueles que depreciassem esse comportamento ficavam<br />

automaticamente inscritos nos padrões partilhados pelo grupo (a “vizinhança”) e<br />

também pelos agentes judiciais e profissionais, ou em termos de Elias e Scotson, pela<br />

“comunhão dos virtuosos” (2000:124).<br />

Ora, aquela atribuição de identidade para Marisa e Carlos não era aceita por eles<br />

de forma passiva. Nem Marisa se assumia como mãe desleixada, nem Carlos como um<br />

pai auto-centrado. Conscientes das fofocas que sobre eles circulavam entre os vizinhos,<br />

no bairro e no âmbito judicial, ambos contra-argumentavam as informações transmitidas<br />

por terceiros. Marisa acusando os “vizinhos” de não ajudar, de mentir, de ter inveja de<br />

sua maternidade, de querer ficar com seus filhos. Carlos, de modo diferente, defendia-se<br />

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