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Baixar - Proppi - UFF

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atirou. Porque o advogado particular que, posteriormente, assumiu a defesa, afirmava<br />

que a arma estava na casa da ex-namorada e não tinha sido levada por ele. Um pouco<br />

sem jeito, li parte de minhas anotações para Valeria.<br />

(…) Lorenzo: é uma ex-namorada minha e eu não tive a intenção de matar<br />

ninguém.<br />

Valeria: mas se você anda com uma escopeta....<br />

Lorenzo: isso da escopeta tem que ver. O importante é que o garoto se salve.<br />

Valeria: sim, para ele e para você.<br />

Lorenzo: eu sou um homem que trabalhou a vida toda.<br />

Valeria: quando alguém trabalhou a vida toda, no dia em que se manda uma<br />

cagada, tem que pagar. Quando não se está fresco, melhor não andar com uma<br />

arma.<br />

Lorenzo: mas vou ficar preso?<br />

Valeria: isto que o senhor me diz de que não tinha intenções de matar o garoto<br />

parece se confirmar. Mas se o senhor está louco por uma mulher, melhor não<br />

andar armado.<br />

Lorenzo: mas se misturam muitos sentimentos.<br />

Valeria lhe explica as possibilidades da pena que poderia ter.<br />

Lorenzo: então, não fiz as coisas bem porque eu não tenho condições de estar<br />

preso. Eu tivesse preferido me matar a estar preso. Não teria me entregue.<br />

Valeria: é melhor estar preso do que morto [Lorenzo se entregou à polícia<br />

quando estava por se suicidar]. O senhor não é um lutador?<br />

“Eu disse isso tudo para ele?! Que besta!”, se surpreendeu Valeria. Não foram<br />

muitas as informações sobre a escopeta –“isso da escopeta tem que ver”, diria Lorenzo-,<br />

mas minhas anotações tinham cumprido uma outra função. De alguma forma, teriam<br />

explicitado para Valeria um modo naturalizado de intervir, perguntar, opinar. A leitura<br />

excepcional do caderno de campo e as inúmeras conversas que mantive com Valeria<br />

sempre mostravam a capacidade crítica que ela tinha sobre o que fazia e sobre o<br />

sistema. O certo é que desde a primeira entrevista Valeria marcou o fato de não se sentir<br />

representativa deste mundo judiciário –“a senhora me olhou de cima para baixo, sem<br />

acreditar que eu fosse promotora”. Desde a roupa, a forma intempestiva de conversar, o<br />

fato de não circular pelos corredores, até os questionamentos que fazia do<br />

funcionamento do sistema e da média das pessoas que nele atuavam, eram reivindicados<br />

por Valeria como variáveis para se apresentar como uma “outsider”.<br />

O aspecto jovial de Valeria Mena não terminava de refletir seus 39 anos. Ela<br />

também vinha de uma “carreira judicial”. Tinha se formado na Universidade Nacional<br />

de Los Pantanos e começado trabalhar nos “Tribunales” daquele departamento em<br />

1989, como “meritória” de uma defensoria pública. Quatro anos depois, em 1993, foi<br />

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