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Baixar - Proppi - UFF

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investigação estarem circulando por “endereços” e “vizinhos do bairro”, o objeto<br />

“roubado” ainda poderia ser vinculado com uma certa rede de relações que permitiria<br />

identificar o possível “autor”.<br />

A testemunha que não aparecia<br />

Passados alguns dias, assim que cheguei à UFI, Sebastián me disse: “ligou Raúl<br />

Lucero”. Tive a sensação de que um fantasma finalmente aparecia. Minha surpresa foi<br />

maior quando Sebastián acrescentou o que Lucero teria lhe adiantado ao telefone: “ele<br />

viu a briga entre Sopa e Cacá, mas afirmou que não disse que mataram Cacá, que<br />

apenas conhece Cacá de vista e, ainda mais, que detesta Cacá”. Raúl Lucero também<br />

disse que no dia em que tinha sido citado à UFI não tinha conseguido ir porque era o<br />

aniversário da filha dele. Acordou com Sebastián, ao telefone, se apresentar no dia de<br />

folga do trabalho.<br />

No dia combinado, Raúl Lucero, um jovem, na época, de trinta e um anos, foi à<br />

UFI com uma calça azul e uma camisa social branca. Informou trabalhar na construção<br />

do pai, ter namorada e ser pai de uma filha. Disse não saber por que o estavam<br />

buscando… que também não entendia porque a mãe de Cacá tinha ido à casa dele...<br />

“Então, você é ou não é amigo de Cacá?”, perguntou Sebastián, desorientado com a<br />

informação da mãe de Cacá tê-lo visitado na casa. Lucero foi enfático na sua resposta:<br />

“não, para nada”. “Para nada?”, replicou Sebastián. Lucero não duvidou na sua posição:<br />

“esse aí é um bardero [apronta todas] 236 , ninguém gosta dele”.<br />

Já que não eram amigos, Sebastián quis saber se Raúl Lucero alguma vez tinha<br />

tido algum problema com Cacá. Ele contou que uma vez Cacá tinha provocado o<br />

sobrinho dele, mas explicou que o problema não era nenhum em particular: “o problema<br />

com ele é geral, você deixa sua bicicleta por dois segundos e o cara a rouba, é um ratero<br />

[larapio]. Eu me cruzo com ele o tempo todo, mas não lhe dou nem bola”. Lucero não<br />

sabia nem sequer onde Cacá morava, apenas tinha o telefone da casa dele, porque,<br />

236 Bardo, fazer bardo ou ser um bardero, remetem a uma sociabilidade identificada como própria da<br />

sociabilidade dos jovens, nos seus bairros, a partir da década de 90. Gabriel Kessler a define como: “a<br />

ruptura da ordem pública no nível micro-social, por meio da transgressão de regras básicas de convívio<br />

(...). O bardo é uma maneira de estar presente no bairro, de ter protagonismo; marca uma presença nesse<br />

lugar e, apesar de ser esporádico, sem dúvidas constrói um tipo de vínculo, já que obriga a alguma reação<br />

por parte dos outros, embora em muitos casos não faça mais do que reforçar estratégias de evitação e<br />

distanciamento forçado” (2004:239-240). Quando Lucero afirma que Cacá é um “bardero” reforça o<br />

distanciamento e a evitação por parte dele mesmo com Cacá e seus amigos. O que Cacá apronta no bairro<br />

será matéria de crítica por parte de Lucero, bem como de diferenciação social.<br />

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