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O bairro e o juicio<br />

Na audiência de juicio, no depoimento de Talarico, foi possível perceber como a<br />

figura do “bairro” e as valorizações morais sobre o mesmo se manifestavam. Dessa<br />

forma, também Dario aparecia, pela primeira vez e quase que exclusivamente, na<br />

audiência de julgamento de sua morte. Já não como um ‘objeto’ ao qual se colocavam<br />

ou deixavam de colocar as algemas, ou que portava, ou não, uma arma, ou que tinha<br />

recebido um disparo e quase que como um peso morto tinha sido conduzido ao hospital.<br />

Aparecia “em vida”, antes do “fato” que dera origem ao juicio 35 . E junto com Dario “em<br />

vida” apareciam outras relações no “bairro”.<br />

Além das perguntas sobre o procedimento e o acontecido uma vez na comisaría,<br />

Talarico também foi alvo de interrogações sobre o bairro no qual morava e sua relação<br />

com os vizinhos. Como disse, Talarico foi avisado por dois “vizinhos” que sua casa<br />

tinha sido assaltada. Os vizinhos chegaram a descrever a roupa que vestiam os dois<br />

jovens 36 . Deram também seus apelidos, os identificando como dois rapazes que “se<br />

dedicavam a cometer delitos no bairro”.<br />

Com as indicações dos seus vizinhos, Talarico saiu em perseguição dos<br />

possíveis autores e para reaver os objetos roubados. Quando viu dois jovens correndo,<br />

disse ter atirado em um monte de terra ao grito de “alto, polícia”. Conseguiu pegar<br />

Dario, enquanto o outro fugia. Pelo relato de Jiménez, bem como da funcionária de uma<br />

remisería da área, sabemos que Talarico chutou “com alma e vida” o torso de Dario.<br />

Pelo próprio Talarico sabemos que, enquanto o chutava e tentava colocar as algemas,<br />

lhe gritava “Filho da puta, fica em pé, seu lixo”. “Mas o senhor conhecia a pessoa?”,<br />

perguntou o promotor, talvez impressionado com a sanha do policial. “Era uma pessoa<br />

de mal viver, como dizem os vizinhos, bastante conhecida no bairro” 37 . Sobre o mesmo<br />

35 Na etnografia já citada, “Forma de morir y formas vivir”, Maria Pita afirma “o ponto de partida –<br />

enquanto situação única que deu origem aos familiares das vítimas- é o fato das mortes violentas destes<br />

jovens em mãos da polícia; são os mortos, como valor (...) quem são colocados em primeiro plano<br />

(2006:12). Ao mesmo tempo, diz “as narrações sobre as mortes destes jovens são também as narrações de<br />

suas vidas, assim como as das vidas de quem as narram [os familiares]. Os mortos, nos relatos dos<br />

familiares, aparecem lhes dando vida. São narrações sobre formas de viver e também sobre uma práxis”<br />

(2006:12).<br />

36 Dario vestia uma bermuda e uma camiseta da seleção argentina com o número “10” e a inscrição do<br />

jogador “Messi”. Por esta roupa não só foi reconhecido por Talarico, mas também por sua mãe quando foi<br />

reconhecer o corpo.<br />

37 Na primeira etapa da investigação, demonstrando certo conhecimento sobre os garotos do bairro, um<br />

dos vizinhos, cujo depoimento foi “desistido” no juicio, quando lhe foi perguntado se tinha visto se os<br />

meninos estavam armados, respondeu: “pelo pouco que os conheço me dá a impressão que não andam<br />

com armas de fogo, apenas se dedicam a roubar casas vazias”.<br />

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