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Baixar - Proppi - UFF

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pessoa tinha dito. Uma técnica semelhante à de Valeria. A particularidade desta técnica<br />

era que, enquanto digitavam a ata olhando para a tela do computador (e não para o<br />

depoente), passavam longos minutos de silêncio. A pessoa aguardava sentada, já que<br />

não só devia assinar a ata, mas também manifestar seu acordo com a versão final do<br />

registro. Observei que essa pausa no relato e no diálogo suscitava algum comentário<br />

esquecido ou algum esclarecimento por parte do depoente; alguma coisa que não tinha<br />

dito, mas que depois, com a espera, considerava importante de ser dita. Ao mesmo<br />

tempo, provocava que o funcionário perguntasse por novas informações ou detalhes de<br />

uma situação. No caso de Sebastián, ele aproveitava esses momentos para re-perguntar<br />

sobre aspectos já questionados, ora esperando uma confirmação, ora buscando possíveis<br />

contradições:<br />

Durante o depoimento:<br />

Sebastián: mas você o conhecia há pouco [a Cacá], né?<br />

Tony: sim.<br />

Sebastián: 20 dias, né?<br />

Tony: sim.<br />

Minutos depois, quando Sebastián lê: “… há 20 dias que conhecia Cacá, o<br />

imputado…”.<br />

Sebastián: por que você dizia que há 20 dias que o conhecia?<br />

Tony: eu não, o senhor disse.<br />

Sebastián: não, você me disse.<br />

Tony: é que eu o fui conhecendo.<br />

Já Bruno tinha um estilo próprio e diferente. Ao tempo que a pessoa falava, sem<br />

retirar o olhar da pessoa, Bruno digitava literalmente o que a pessoa dizia. Abria as<br />

aspas no texto e transcrevia, inclusive, as idas e vindas da fala, os titubeios e as<br />

correções. O efeito dele estar digitando e olhando para a pessoa era estranho. Algumas<br />

pessoas falavam devagar como esperando que Bruno terminasse de escrever, mas ele<br />

esclarecia que podiam falar normalmente. Sebastián criticava esse estilo, pois achava<br />

que fugia do padrão judicial de registro e que era confuso. Bruno o defendia na linha de<br />

registrar o que a pessoa “realmente” dizia, sem edições.<br />

Apesar das formas mais ou menos literais de registrar os depoimentos, um<br />

aspecto comum eram as mudanças produzidas do relato oral ao escrito. Não se tratava<br />

de alterações que trocassem umas informações por outras, mas, como apontei na<br />

introdução, mudanças de termos, de vocabulário que, além de refletir o habitus dos<br />

funcionários no uso de certas categorias – “rua” por “artéria”, “bêbado” por<br />

“alcoolizado”- pareciam adaptar a linguagem dos leigos aos termos jurídicos. É possível<br />

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