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Baixar - Proppi - UFF

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Nele, como vimos, eram recebidos e tratados conflitos produto de relações cotidianas,<br />

em âmbitos sociais cotidianos – o “bairro”- e para cujo tratamento eram<br />

disponibilizados procedimentos cotidianos para os agentes judiciais. Essa característica<br />

talvez diferencie o “fazer justiça” aqui descrito das formas analisadas em outras<br />

etnografias referidas às intervenções do poder judiciário na Argentina, como, por<br />

exemplo, os trabalhos de Sofia Tiscornia (2006) sobre o caso “Bulacio” 265 ; ou de María<br />

José Sarrabayrouse (2009) sobre a atuação do poder judiciário (ou de grupos dentro<br />

dele) durante a última ditadura militar na Argentina (1976-1983); ou, a partir de outra<br />

abordagem, o trabalho de María Victoria Pita (2006) sobre as formas em que as mortes<br />

resultado da violência policial têm sido “politizadas”, através da intervenção de<br />

familiares das vítimas 266 . Ao analisarem casos nos quais a dimensão política aparece<br />

mais explicitamente colocada como uma variável decisiva na construção da<br />

investigação e da “verdade”, estas etnografias têm enfatizado dimensões da<br />

administração de justiça, distintas daquelas ressaltadas por esta tese. Neles, o Estado –<br />

sob diversas formas (acusado, procurador, testemunha) - aparece como uma parte<br />

fundamental do processo judicial. Esta característica faz com que os procedimentos<br />

sejam utilizados, embora não exclusivamente, em função de posicionamentos e<br />

ideologias políticas e também em relação com as pressões e o “ativisimo” de<br />

movimentos sociais (de direitos humanos, de organizações civis, de “familiares”). As<br />

“partes” destes processos, assim, se constituem e apresentam diante dos agentes<br />

judiciais de forma diferenciada em relação aos casos que eu pude observar e descrever<br />

no meu trabalho de campo 267 . Neles, a “politização” dos casos (e dos procedimentos)<br />

265 O caso “Bulacio” refere à morte em mãos da polícia do jovem Walter Bulacio, após ser preso em uma<br />

“razzia” policial em um show de rock, na cidade de Buenos Aires. Como mencionei no Capítulo 1, por<br />

esse caso, o Estado argentina foi levado à Corte Interamericana de Direitos Humanos, diante da<br />

intervenção fundamentalmente dois organismos de direitos humanos.<br />

266 Como assinala Pita, os casos analisados por ela não referem a situações de notoriedade pública ou<br />

midática, nem a mortes de militantes políticos, mas de jovens comuns, na sua maioria de bairros pobres.<br />

No entanto, Pita marca que “afirmar que não se trata de fatos de violência política, isto é de crimes<br />

políticos, não implica que não se trate de mortes políticas Pelo contrário, é possível defini-las como<br />

mortes políticas já que é o poder de polícia, o rosto descoberto do poder do estado, que as têm produzido”<br />

(2006:19). Nesse sentido, a tese baseia-se no processo de “politização” destas mortes “através do protesto,<br />

a denúncia e a impugnação da violência de estado” (2006:7).<br />

267 Embora de forma diferenciada com os trabalhos antes citados, também posso mencionar neste aspecto<br />

a etnografia de Brigida Renoldi sobre a investigação e julgamento de casos de narcotráfico na fronteira<br />

Argentina-Paraguai, considerando a relevância atribuída nesses casos a valores relativos à nação, à saúde<br />

pública, à ordem social. Assim, Renoldi afirma, por exemplo, que “as categorias ordenadas nas formas<br />

classificatórias que compõem a instituição judicial se tornam eficazes na trilogia de agentes do sistema<br />

judicial, acusado e público. O público aqui só alude à imaginada comunidade nacional, que cria por<br />

acordo as regras de conduta humana em códigos que se lhe aplicam. Não remete, estritamente, à<br />

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