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Baixar - Proppi - UFF

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coisas, mas não andava drogado todos os dias, era uma alegria de viver, era o<br />

maluquinho da família, incapaz de uma maldade. Vou trazer uma foto dele<br />

sorrindo.<br />

Valeria: gostaria sim.<br />

Mãe: a senhora vai aprender a olhar os olhos, quando a pessoa é boa, é franca, é<br />

doce. Eu sei que a senhora é boa, sei que vai descobrir a verdade do que<br />

aconteceu. Se a senhora soubesse tudo o que eu passei. Essa é minha vida, Dra.<br />

Estou escrevendo um livro sobre minha vida para que leiam meus filhos.<br />

A senhora contou boa parte dos problemas com os filhos e netos, seus diversos<br />

empregos e trabalhos, o abandono do marido, sua chegada ao conurbano, proveniente<br />

do Chaco, província do norte argentino, havia mais de 20 anos. Quando foi embora,<br />

Valeria me disse que uma frase típica no Ministério Público era “a mim se me encrava<br />

uma unha e morro de dor e estes negros lhes pegam cinco tiros e não morrem”. Para<br />

Valeria, nesse âmbito, não era comum alguém parar sua rotina e ouvir o que as pessoas<br />

tinham a dizer. Para ela, era uma parte fundamental do trabalho. Nas semanas seguintes,<br />

a mãe de Angel ligou para Valeria para dar notícias das testemunhas. O filho dela estava<br />

se ocupando disso no bairro. Para a família, era importante limpar a honra de Angel Paz.<br />

“Era um anjo”, “o maluquinho da família”, “um doce de pessoa”, “incapaz de fazer uma<br />

maldade”.<br />

Como já contei, não era a primeira vez que a mãe de Angel ia ver Valeria. Em<br />

uma conversa mais breve, a mãe chorou e disse que queria “saber a verdade do<br />

acontecido”. Estava disposta a mostrar como viviam e que o filho não saía a roubar.<br />

Valeria tinha me dito que não sabia o motivo, mas que não acreditava nela, “não sei por<br />

que, mas não me convenceu”. Dois meses depois, naquele dia de janeiro, a mãe estava<br />

insistindo em mostrar quem era o filho. Ofereceu testemunhas do bairro que pudessem<br />

aportar dados sobre o acontecido. Valeria, embora tivesse outros elementos de<br />

convicção no processo –“aí lhe estão mentindo porque isso está acreditado”-, foi<br />

receptiva. Pediu para a mãe levar as testemunhas para a UFI.<br />

Ao mesmo tempo, Valeria advertiu a senhora que tivesse “cuidado com o que as<br />

pessoas falam”. As informações aportadas por testemunhas do bairro, através da<br />

mediação dos familiares, podiam ser suspeitas, pelo menos, enquanto não batessem com<br />

outros elementos existentes no processo. Por isso, Valeria precisava ouví-las e formar<br />

sua própria convicção. Podiam ser dados importantes, mas precisavam passar pelo crivo<br />

da credibilidade profissional. O “bairro” e a “credibilidade” se associavam, neste e em<br />

outros processos, na procura, escuta e produção das testemunhas. Como vimos, em<br />

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