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Baixar - Proppi - UFF

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e de abuso sexual, embora ela tivesse pedido, recentemente, para trabalhar menos com<br />

esses casos, porque a afetavam pessoalmente (por isso, alguns começaram a ser<br />

encaminhados para Diego).<br />

Progressivamente, meu caderno de campo foi sendo incorporado na rotina da<br />

UFI. Assim, passou, inclusive, de objeto de intriga a ganhar certa utilidade. Uma<br />

espécie de memória sobre certos dados que eu poderia ter anotado. Algumas das vezes<br />

em que isso me foi requerido, não consegui dar uma resposta. Como as consultas eram<br />

por dados pontuais, apropriados à investigação criminal, minhas anotações podiam ser<br />

vagas, ou melhor, anônimas demais. Por exemplo, nem em todos os casos eu costumava<br />

anotar os nomes completos das pessoas envolvidas, mas apenas alguma identificação do<br />

caso. Também não anotava endereços completos, apenas uma indicação da localidade.<br />

Nem datas exatas, números de tribunal, promotoria ou defensoria, dos antecedentes<br />

penais dos “imputados”. A percepção e a relevância do tipo de informação, era<br />

claramente diferenciada. Ao mesmo tempo, às vezes alguém dizia, com ironia, não<br />

entender para que anotava “aquilo”, se não tinha relevância alguma 126 .<br />

Em outro tipo de consulta sobre minhas anotações, o caderno pareceu ser mais<br />

útil. Valeria afirmava que eu era sua agenda perfeita, pois lembrava dos dias em que tal<br />

pessoa de tal processo iria depor. A rotina dela na UFI era uma seqüência de<br />

depoimentos, para mim o depoimento de alguém nos casos que acompanhei mais<br />

sistematicamente era um evento significativo.<br />

Em uma ocasião, Valeria me perguntou se podia ver em meu caderno as<br />

anotações sobre o depoimento “308” de um “imputado”. Tratava-se do caso de Lorenzo.<br />

Na época, Lorenzo era viúvo e tinha 58 anos. O caso teve certa ressonância na UFI<br />

porque era vizinho de Sebastián. Além da acusação por “tentativa de homicídio e porte<br />

de arma de guerra”, estava o fato dele ter entrado na casa de sua ex-namorada, chutado a<br />

porta e atirado contra o irmão dela. O garoto estava no hospital e de sua vida ou morte<br />

dependia que a acusação se agravasse para homicídio. Naquele dia, Lorenzo, por<br />

sugestão do defensor público, tinha feito uso de seu direito a não depor. No entanto, ele<br />

manteve uma conversa com Valeria 127 . Por isso, muitos dias depois, ela queria saber se,<br />

entre minhas anotações, o homem tinha falado alguma coisa da escopeta com a qual<br />

126 Como descrevo em outros capítulos, a discrepância entre anotar ou lembrar dados concretos e anotar<br />

ou lembrar aspectos gerais, menos específicos, também era um diferencial perceptível entre as perguntas<br />

dos funcionários e as respostas das testemunhas e “imputados”.<br />

127 Ver Capítulo 4.<br />

129

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