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Manual de Direito Civil - Flávio Tartuce - 7ª Ed. - 2017

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<strong>Manual</strong> <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> <strong>Civil</strong><br />

po<strong>de</strong>m ser classificados nas formas expostas no próximo tópico.<br />

Quanto aos animais, são enquadrados atualmente como coisas no <strong>Direito</strong> Privado Brasileiro. Todavia,<br />

há uma tendência em se sustentar que seriam sujeitos <strong>de</strong> direito, tratados não como coisas, mas até como<br />

um terceiro gênero. Vale lembrar que o tratamento como terceiro gênero consta do BGB Alemão,<br />

estabelecendo o seu art. 90­A que os animais não são coisas (“Tiere sind keine Sachen”). O mesmo<br />

comando prevê, em continuida<strong>de</strong>, que os animais são protegidos por estatutos especiais. Todavia, na falta<br />

<strong>de</strong>ssas normas, são regulados pelas regras aplicáveis às coisas, com as necessárias modificações.<br />

No Brasil, o Projeto <strong>de</strong> Lei 351/2015, originário do Senado, preten<strong>de</strong> seguir o mesmo caminho,<br />

introduzindo regra no art. 82 do Código <strong>Civil</strong> e estabelecendo, na mesma linha do Código <strong>Civil</strong> Alemão,<br />

que os animais não são coisas, remetendo o seu tratamento para a legislação específica.<br />

A proposta merece reflexões, especialmente pelo fato <strong>de</strong> ainda ser necessário tutelar os direitos das<br />

pessoas humanas, caso dos nascituros e embriões. Superada essa fase, na nossa realida<strong>de</strong>, pensamos que<br />

será possível esten<strong>de</strong>r alguns direitos aos animais. Como palavras finais sobre o tema, resta outro <strong>de</strong>safio:<br />

se os animais são sujeitos <strong>de</strong> direitos, ou a eles equiparados, teriam também <strong>de</strong>veres? Eis aqui uma<br />

pergunta <strong>de</strong> difícil resposta.<br />

Pois bem, antes da visualização das diversas categorias <strong>de</strong> bens, é interessante abordar o tema do<br />

patrimônio mínimo, que muito interessa à civilística contemporânea. Insta verificar que a categoria pura<br />

do patrimônio mais interessava aos civilistas dos séculos passados, sendo certo que a valorização do<br />

mínimo vital é conceito emergente da contemporaneida<strong>de</strong>. 100<br />

Atualmente, percebe­se que o rol dos direitos da personalida<strong>de</strong> ou direitos existenciais ganha um<br />

outro cunho, recebendo a matéria um tratamento específico em dispositivos legais que regulamentam<br />

direitos eminentemente patrimoniais. Nesse ponto <strong>de</strong> intersecção, que coloca os direitos da personalida<strong>de</strong><br />

e os direitos patrimoniais no mesmo plano, é que surge a tese do patrimônio mínimo, <strong>de</strong>senvolvida com<br />

maestria pelo Ministro do STF e Professor Luiz <strong>Ed</strong>son Fachin, em obra em que é apontada a tendência <strong>de</strong><br />

repersonalização do <strong>Direito</strong> <strong>Civil</strong>. 101 A pessoa passa a ser o centro do <strong>Direito</strong> Privado, em <strong>de</strong>trimento do<br />

patrimônio (<strong>de</strong>spatrimonialização do <strong>Direito</strong> <strong>Civil</strong>).<br />

Sobre o tema, ensina o Ministro Fachin que “a ‘repersonalização’ do <strong>Direito</strong> <strong>Civil</strong> recolhe, com<br />

<strong>de</strong>staque, a partir do texto constitucional, o princípio da dignida<strong>de</strong> da pessoa humana. Para bem enten<strong>de</strong>r<br />

os limites propostos à execução à luz do princípio constitucional da dignida<strong>de</strong> da pessoa humana, têm<br />

sentido verificações preliminares. A dignida<strong>de</strong> da pessoa é princípio fundamental da República Fe<strong>de</strong>rativa<br />

do Brasil. É o que chama <strong>de</strong> princípio estruturante, constitutivo e indicativo das i<strong>de</strong>ias diretivas básicas <strong>de</strong><br />

toda a or<strong>de</strong>m constitucional. Tal princípio ganha concretização por meio <strong>de</strong> outros princípios e regras<br />

constitucionais formando um sistema interno harmônico, e afasta, <strong>de</strong> pronto, a i<strong>de</strong>ia <strong>de</strong> predomínio do<br />

individualismo atomista no <strong>Direito</strong>. Aplica­se como leme a todo o or<strong>de</strong>namento jurídico nacional<br />

compondo­lhe o sentido e fulminando <strong>de</strong> inconstitucionalida<strong>de</strong> todo preceito que com ele conflitar. É <strong>de</strong><br />

um princípio emancipatório que se trata”. 102<br />

Em síntese, a tese po<strong>de</strong> ser resumida pelo seguinte enunciado: <strong>de</strong>ve­se assegurar à pessoa um mínimo<br />

<strong>de</strong> direitos patrimoniais, para que viva com dignida<strong>de</strong>. Vejamos alguns exemplos <strong>de</strong> sua concreção,<br />

iniciando­se pela lei e chegando até a jurisprudência nacional.<br />

De início, a premissa do patrimônio mínimo po<strong>de</strong> ser retirada do art. 548 do Código <strong>Civil</strong>, pelo qual<br />

é nula a doação <strong>de</strong> todos os bens, sem a reserva do mínimo para a sobrevivência do doador (nulida<strong>de</strong> da<br />

doação universal). Ilustrando, é nula a doação <strong>de</strong> um único bem para or<strong>de</strong>m religiosa ou igreja (nesse<br />

sentido, ver: TJDF, Recurso 2007.09.1.022199­3, Acórdão 403.461, 1.ª Turma Recursal dos Juizados<br />

Especiais Cíveis e Criminais, Rel. Juíza Sandra Reves Vasques Tonussi, DJDFTE 02.02.2010, p. 109).<br />

Como segundo exemplo que po<strong>de</strong> ser retirado da lei, o art. 928, parágrafo único, do CC, ao tratar da<br />

in<strong>de</strong>nização contra o incapaz, enuncia que o valor in<strong>de</strong>nizatório <strong>de</strong>ve ser fixado pelo juiz com equida<strong>de</strong>,<br />

para não privar o incapaz e os seus <strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ntes do mínimo para que vivam com dignida<strong>de</strong>. Alerte­se ao<br />

fato <strong>de</strong> que o Código <strong>Civil</strong> Brasileiro, a exemplo <strong>de</strong> outras codificações europeias, consagrou a

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