14.04.2017 Views

Manual de Direito Civil - Flávio Tartuce - 7ª Ed. - 2017

You also want an ePaper? Increase the reach of your titles

YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.

<strong>Manual</strong> <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> <strong>Civil</strong><br />

Todavia, o próprio STJ tem feito um contraponto a respeito da mora, concluindo que a cobrança <strong>de</strong><br />

valores abusivos por entida<strong>de</strong>s bancárias <strong>de</strong>scaracteriza esse inadimplemento relativo do <strong>de</strong>vedor (nesse<br />

sentido: STJ, AgRg no REsp 979.132/RS, 4.ª Turma, Rel. Min. Fernando Gonçalves, j. 21.10.2008,<br />

DJe 03.11.2008). Os julgados estão inspirados no Enunciado n. 354 do CJF/STJ, da IV Jornada <strong>de</strong><br />

<strong>Direito</strong> <strong>Civil</strong>, cuja redação é a seguinte: “a cobrança <strong>de</strong> encargos e parcelas in<strong>de</strong>vidas ou abusivas<br />

impe<strong>de</strong> a caracterização da mora do <strong>de</strong>vedor”. A gran<strong>de</strong> dúvida é saber o que são encargos abusivos,<br />

uma vez que o próprio STJ tem entendimento <strong>de</strong> que as entida<strong>de</strong>s bancárias não estão sujeitas às<br />

limitações da Lei <strong>de</strong> Usura. Nessa linha, também recentemente foi editada a Súmula 382, prevendo que<br />

“A estipulação <strong>de</strong> juros remuneratórios superiores a 12% ao ano, por si só, não indica abusivida<strong>de</strong>”.<br />

De toda a sorte, para este autor, a ausência <strong>de</strong> mora não é requisito para a revisão do contrato.<br />

Compartilhando <strong>de</strong>sse pensamento, anota Fábio Po<strong>de</strong>stá:<br />

“Temos, portanto, que fechar as portas do <strong>de</strong>vedor para a revisão judicial pela alegação<br />

contrária <strong>de</strong> que está em mora, não aten<strong>de</strong> a qualquer rigor legal, especialmente porque o que<br />

está em jogo é a justiça contratual vinculada à necessária comutativida<strong>de</strong> das prestações”. 57<br />

Tem razão o magistrado paulista, uma vez que na gran<strong>de</strong> maioria das vezes aquele que está em<br />

mora é quem mais precisa da revisão, justamente para <strong>de</strong>monstrar a abusivida<strong>de</strong> contratual.<br />

Por fim, como terceira questão, reafirme­se que a jurisprudência, notadamente a superior, tem<br />

entendido pela necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> <strong>de</strong>pósito da parte incontroversa, em juízo ou fora <strong>de</strong>le, para que a revisão<br />

contratual seja possível (por todos: STJ, AgRg no Ag 1.165.354/DF, 3.ª Turma, Rel. Min. Sidnei<br />

Beneti, j. 15.12.2009, DJe 02.02.2010). Repise­se que a questão se concretizou <strong>de</strong> tal forma que foi<br />

introduzido dispositivo nesse sentido no Código <strong>de</strong> Processo <strong>Civil</strong> <strong>de</strong> 1973, pela Lei 12.810/2013.<br />

De acordo com o art. 285­B do Estatuto Processual anterior, nos litígios que tivessem por objeto<br />

obrigações <strong>de</strong>correntes <strong>de</strong> empréstimo, financiamento ou arrendamento mercantil, o autor da ação <strong>de</strong><br />

revisão contratual <strong>de</strong>veria discriminar na petição inicial, <strong>de</strong>ntre as obrigações contratuais, aquelas que<br />

preten<strong>de</strong>sse controverter, quantificando o valor incontroverso. Em complemento, estabelecia o seu § 1.º<br />

que o valor incontroverso <strong>de</strong>veria continuar sendo pago no tempo e no modo contratados.<br />

O Novo CPC repetiu a regra e até a ampliou, impondo expressamente a pena <strong>de</strong> inépcia da petição<br />

inicial, no caso <strong>de</strong> seu <strong>de</strong>srespeito. Conforme o art. 330, § 2.º, do CPC/2015, “nas ações que tenham<br />

por objeto a revisão <strong>de</strong> obrigação <strong>de</strong>corrente <strong>de</strong> empréstimo, <strong>de</strong> financiamento ou <strong>de</strong> alienação <strong>de</strong> bens,<br />

o autor terá <strong>de</strong>, sob pena <strong>de</strong> inépcia, discriminar na petição inicial, <strong>de</strong>ntre as obrigações contratuais,<br />

aquelas que preten<strong>de</strong> controverter, além <strong>de</strong> quantificar o valor incontroverso do débito”. O § 3.º do<br />

comando complementa esse tratamento, na linha do anterior, prescrevendo que o valor incontroverso<br />

<strong>de</strong>verá continuar a ser pago no tempo e modo contratados.<br />

O entendimento jurispru<strong>de</strong>ncial e os comandos processuais estão fundados na boa­fé objetiva, pois<br />

aquele que preten<strong>de</strong> a revisão <strong>de</strong>ve <strong>de</strong>monstrar a sua pontualida<strong>de</strong>.<br />

Na opinium <strong>de</strong>ste autor, realizado o pagamento, <strong>de</strong> forma judicial ou extrajudicial, o credor <strong>de</strong>ve<br />

recebê­lo, sob pena <strong>de</strong> violação da própria boa­fé. Como bem pon<strong>de</strong>ra Sérgio Iglesias Nunes <strong>de</strong> Souza,<br />

trata­se <strong>de</strong> aplicação do <strong>de</strong>ver <strong>de</strong> mitigar o prejuízo (duty to mitigate the loss), aqui antes estudado.<br />

Pontua o jurista que, “caso o credor se recuse a receber a parcela do valor sob or<strong>de</strong>m judicial, a atitu<strong>de</strong><br />

daquele po<strong>de</strong>rá afrontar o princípio do duty to mitigate <strong>de</strong> loss (<strong>de</strong>ver <strong>de</strong> mitigar o próprio prejuízo),<br />

atualmente muito utilizada pelos tribunais brasileiros, já que não há crime <strong>de</strong> <strong>de</strong>sobediência, ainda que<br />

assim fosse <strong>de</strong>terminado pelo juiz da causa, pois este só existe na expressa hipótese legal (nullum crime<br />

sine lege), em que pese divergência <strong>de</strong> opiniões neste sentido”. 58 Vejamos como a jurisprudência se<br />

pronunciará sobre tal situação no futuro.

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!