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Manual de Direito Civil - Flávio Tartuce - 7ª Ed. - 2017

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<strong>Manual</strong> <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> <strong>Civil</strong><br />

substituição aos excepcionais com <strong>de</strong>senvolvimento completo. Em suma, as pessoas que por causa transitória ou<br />

<strong>de</strong>finitiva não pu<strong>de</strong>rem exprimir vonta<strong>de</strong>, caso do sujeito em coma, passaram a ser relativamente incapazes.<br />

Assim, com as mudanças citadas, parece que o sistema finalmente encontrou uma coerência técnica, pois os<br />

incapazes para o casamento são apenas os menores <strong>de</strong> 16 anos, nos termos do art. 1.517 do Código <strong>Civil</strong> e do<br />

novo art. 3.º do Código <strong>Civil</strong>, <strong>de</strong>vidamente atualizado com a Lei 13.146/2015. Como se verá a seguir, o Estatuto<br />

da Pessoa com Deficiência também retirou do sistema a possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> nulida<strong>de</strong> absoluta do casamento da<br />

pessoa enferma mental, tendo sido revogado o art. 1.548, I, da codificação material. Isso também colaborou para<br />

a citada coerência técnica, na opinião <strong>de</strong>ste autor.<br />

Vale lembrar, na linha do exposto no Capítulo 2 <strong>de</strong>ste livro, que as pessoas com <strong>de</strong>ficiência tiveram uma<br />

inclusão familiar plena pelo seu estatuto protetivo. Conforme o art. 6.º da Lei 13.146/2015, a <strong>de</strong>ficiência não<br />

afeta a plena capacida<strong>de</strong> civil da pessoa, inclusive para: a) casar­se e constituir união estável; b) exercer direitos<br />

sexuais e reprodutivos; c) exercer o direito <strong>de</strong> <strong>de</strong>cidir sobre o número <strong>de</strong> filhos e <strong>de</strong> ter acesso a informações<br />

a<strong>de</strong>quadas sobre reprodução e planejamento familiar; d) conservar sua fertilida<strong>de</strong>, sendo vedada a esterilização<br />

compulsória; e) exercer o direito à família e à convivência familiar e comunitária; e f) exercer o direito à guarda,<br />

à tutela, à curatela e à adoção, como adotante ou adotando, em igualda<strong>de</strong> <strong>de</strong> oportunida<strong>de</strong>s com as <strong>de</strong>mais<br />

pessoas. O Estatuto da Pessoa com Deficiência, como se vê, preten<strong>de</strong>u igualar a pessoa com <strong>de</strong>ficiência para os<br />

atos existenciais, o que representa um notável avanço, na opinium <strong>de</strong>ste autor. Na tutela das pessoas com<br />

<strong>de</strong>ficiência, substituiu­se a premissa da dignida<strong>de</strong>­vulnerabilida<strong>de</strong> pela da dignida<strong>de</strong>­igualda<strong>de</strong>. Todavia, alguns<br />

reparos <strong>de</strong>vem ser feitos na lei, especialmente diante do Novo CPC. Por isso, somos favoráveis, em parte, à<br />

aprovação do Projeto <strong>de</strong> Lei 757/2015, em curso no Senado Fe<strong>de</strong>ral, e que tem nosso parecer. A análise do cerne<br />

da proposição será feita no presente Capítulo.<br />

Feitas tais consi<strong>de</strong>rações e em complemento, nos termos do art. 1.517, caput, do Código <strong>Civil</strong> o homem e a<br />

mulher em ida<strong>de</strong> núbil, com 16 anos completos, po<strong>de</strong>m casar, exigindo­se autorização <strong>de</strong> ambos os pais, ou <strong>de</strong><br />

seus representantes legais, enquanto não atingida a maiorida<strong>de</strong> civil (18 anos). Em havendo divergência entre os<br />

pais, a questão será levada ao juiz, que <strong>de</strong>cidirá <strong>de</strong> acordo com o caso concreto, sempre buscando a proteção<br />

integral do menor e da família (art. 1.517, parágrafo único, do CC). Conforme esclarecedor enunciado aprovado<br />

na V Jornada <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> <strong>Civil</strong>, em 2011, “o artigo 1.517 do Código <strong>Civil</strong>, que exige autorização dos pais ou<br />

responsáveis para casamento, enquanto não atingida a maiorida<strong>de</strong> civil, não se aplica ao emancipado” (Enunciado<br />

n. 512).<br />

Previa originalmente o art. 1.518 do Código <strong>Civil</strong> que a autorização especial para o casamento po<strong>de</strong>ria ser<br />

revogada pelos pais, tutores ou curadores até a celebração do casamento. Esse comando também foi alterado pela<br />

Lei 13.146/2015 (Estatuto da Pessoa com Deficiência), passando a enunciar que “até a celebração do casamento<br />

po<strong>de</strong>m os pais ou tutores revogar a autorização”. Como se percebe, não há mais menção aos curadores, uma vez<br />

que não se <strong>de</strong>creta mais a nulida<strong>de</strong> das pessoas que estavam mencionadas no art. 1.548, I, do CC/2002, ora<br />

revogado pelo mesmo Estatuto, como antes <strong>de</strong>stacado.<br />

Se a <strong>de</strong>negação do consentimento for injusta, esta po<strong>de</strong> ser suprida pelo juiz, sempre em busca da proteção<br />

integral do menor e da família (art. 1.519 do CC). Anote­se que havendo a necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong>sse suprimento, o<br />

casamento será celebrado pelo regime da separação obrigatória <strong>de</strong> bens (art. 1.641, III, do CC).<br />

O art. 1.520 do CC/2002 traz questão polêmica, diante <strong>de</strong> duas novas leis que surgiram sucessivamente à<br />

codificação material, a Lei 11.106/2005 e a Lei 12.015/2009. É a redação do dispositivo do Código <strong>Civil</strong> em<br />

comento: “Excepcionalmente, será permitido o casamento <strong>de</strong> quem ainda não alcançou a ida<strong>de</strong> núbil (art. 1.517),<br />

para evitar imposição ou cumprimento <strong>de</strong> pena criminal ou em caso <strong>de</strong> gravi<strong>de</strong>z”.<br />

A polêmica teve início com a entrada em vigor da Lei 11.106/2005, que afastou a extinção da punibilida<strong>de</strong><br />

nos casos <strong>de</strong> estupro presumido (art. 107, VII e VIII, do CP), ou seja, na hipótese <strong>de</strong> alguém manter uma relação<br />

sexual com uma criança ou adolescente com ida<strong>de</strong> inferior a 14 anos, e <strong>de</strong>pois se casar com ela. Como não se<br />

po<strong>de</strong>ria falar mais em extinção da punibilida<strong>de</strong> com a novel legislação, muitos doutrinadores já passaram a<br />

enten<strong>de</strong>r que o art. 1.520 do CC estaria revogado na parte que tratava da extinção da pena criminal. 33<br />

Todavia, escrevendo em coautoria com José Fernando Simão, sustentávamos a não <strong>de</strong>rrogação do<br />

dispositivo, pois a questão <strong>de</strong>veria ser analisada caso a caso. Isso porque a ação penal em casos tais era privada,<br />

po<strong>de</strong>ndo o casamento autorizado judicialmente funcionar como perdão tático do crime, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> que a menor<br />

<strong>de</strong>monstrasse discernimento bastante para tanto. Entendíamos que, por tal caminho, o <strong>Direito</strong> <strong>de</strong> Família<br />

prevaleceria sobre o <strong>Direito</strong> Penal, incidindo o princípio da função social da família. 34

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