14.04.2017 Views

Manual de Direito Civil - Flávio Tartuce - 7ª Ed. - 2017

Create successful ePaper yourself

Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.

<strong>Manual</strong> <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> <strong>Civil</strong><br />

Para ilustrar, vale voltar ao seguinte exemplo, geralmente utilizado em aulas e exposições sobre o assunto,<br />

antes das mudanças engendradas pelo Estatuto da Pessoa com Deficiência. Imagine­se que alguém compra<br />

um imóvel <strong>de</strong> certa pessoa que parecia estar dotada <strong>de</strong> condições psicológicas normais quando da prática<br />

do ato. Posteriormente, a pessoa é interditada e o laudo médico aponta que o ven<strong>de</strong>dor já era enfermo e<br />

<strong>de</strong>ficiente mental sem discernimento para a prática dos atos da vida civil quando a venda foi realizada.<br />

Pela regra geral anterior <strong>de</strong> nulida<strong>de</strong>, o contrato seria <strong>de</strong>clarado nulo, atingindo também eventuais terceiros<br />

<strong>de</strong> boa­fé, pelos efeitos erga omnes e ex tunc da sentença <strong>de</strong>claratória <strong>de</strong> nulida<strong>de</strong> absoluta.<br />

Com o <strong>de</strong>vido respeito, como a eticida<strong>de</strong> é um dos fundamentos da atual codificação, não havia como<br />

percorrer o último caminho, <strong>de</strong>vendo os negócios ser preservados em face das partes que agiram <strong>de</strong> boafé.<br />

Notadamente no caso exposto, a boa­fé é cristalina se o ven<strong>de</strong>dor não aparentava a situação <strong>de</strong><br />

enfermida<strong>de</strong> quando o ato foi celebrado.<br />

De toda sorte, cumpre esclarecer que, com o Estatuto da Pessoa com Deficiência, esse exemplo<br />

merece sofrer adaptações, especialmente pelo fato <strong>de</strong> não mais existirem maiores que sejam absolutamente<br />

incapazes no sistema civil. Assim, imagine­se que o caso envolve uma pessoa que não possa exprimir<br />

vonta<strong>de</strong> por causa <strong>de</strong>finitiva (novo art. 4.º, III, do CC), que tenha tido a nomeação <strong>de</strong> um curador,<br />

apontando a sentença da ação própria a falta <strong>de</strong> discernimento quando o ato foi praticado. A diferença é<br />

que o ato é anulável e não nulo, <strong>de</strong>vendo, pela mesma forma, ser convalidado pela boa­fé.<br />

Como últimas palavras sobre o tema, infelizmente, a única ressalva expressa quanto ao negociante <strong>de</strong><br />

boa­fé encontrável na parte geral do Código <strong>Civil</strong> diz respeito aos terceiros <strong>de</strong> boa­fé frente ao negócio<br />

jurídico simulado (art. 167, § 2.º, do CC/2002). Tal premissa <strong>de</strong>veria constar como parágrafo único do<br />

art. 166, alcançando todas as hipóteses <strong>de</strong> nulida<strong>de</strong> absoluta, não só em face <strong>de</strong> terceiros, mas também<br />

quanto a qualquer negociante direto do ato que esteja movido por uma boa conduta. Automaticamente, a<br />

boa­fé venceria não só os negócios jurídicos nulos, mas também os anuláveis. Pela falta <strong>de</strong> previsão legal<br />

nesse sentido, cabe à doutrina e à jurisprudência realizar a <strong>de</strong>vida pon<strong>de</strong>ração entre a boa­fé e as<br />

invalida<strong>de</strong>s dos negócios, buscando a conservação dos atos como premissa­regra.<br />

Da nulida<strong>de</strong> relativa ou anulabilida<strong>de</strong>. Negócio jurídico anulável<br />

2.5.6.3<br />

A nulida<strong>de</strong> relativa envolve preceitos <strong>de</strong> or<strong>de</strong>m privada, <strong>de</strong> interesse das partes, o que altera<br />

totalmente o seu tratamento legal, se confrontada com a nulida<strong>de</strong> absoluta, antes estudada. As hipóteses <strong>de</strong><br />

nulida<strong>de</strong> relativa ou anulabilida<strong>de</strong> constam do art. 171 da novel codificação material, a saber:<br />

a)<br />

b)<br />

c)<br />

Quando o negócio for celebrado por relativamente incapaz, sem a <strong>de</strong>vida assistência, conforme rol<br />

que consta do art. 4.º do CC.<br />

Diante da existência <strong>de</strong> vício a acometer o negócio jurídico, como o erro, o dolo, a coação moral<br />

ou psicológica, a lesão, o estado <strong>de</strong> perigo ou a frau<strong>de</strong> contra credores. Lembre­se que a coação<br />

física e a simulação são vícios do negócio jurídico que geram a sua nulida<strong>de</strong> absoluta, não a<br />

nulida<strong>de</strong> relativa.<br />

Nos casos especificados <strong>de</strong> anulabilida<strong>de</strong>. Exemplifica­se com as previsões dos arts. 1.647 e<br />

1.649 do atual Código. Para <strong>de</strong>terminados atos, elencados no primeiro dispositivo, como no caso<br />

da venda <strong>de</strong> bem imóvel, a norma exige a outorga uxória (mulher) ou marital (marido).<br />

Desrespeitado esse dispositivo, caberá ação anulatória a ser promovida pelo cônjuge, no prazo<br />

<strong>de</strong>ca<strong>de</strong>ncial <strong>de</strong> dois anos, contados do fim da socieda<strong>de</strong> conjugal (art. 1.649). Destaque­se ainda,<br />

para ilustrar, a previsão do art. 496 do CC, segundo o qual é anulável a venda <strong>de</strong> ascen<strong>de</strong>nte a<br />

<strong>de</strong>scen<strong>de</strong>nte não havendo autorização dos <strong>de</strong>mais <strong>de</strong>scen<strong>de</strong>ntes e do cônjuge do alienante.<br />

Nas situações concretas <strong>de</strong> anulabilida<strong>de</strong>, o seu reconhecimento <strong>de</strong>verá ser pleiteado por meio da<br />

<strong>de</strong>nominada ação anulatória, que também seguia, regra geral, o rito ordinário, correspon<strong>de</strong>nte ao<br />

procedimento comum do Novo CPC. Tal ação tem natureza constitutiva negativa, estando relacionada com<br />

direitos potestativos, o que justifica os prazos <strong>de</strong>ca<strong>de</strong>nciais a elas referidos (critério científico <strong>de</strong> Agnelo

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!