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Manual de Direito Civil - Flávio Tartuce - 7ª Ed. - 2017

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<strong>Manual</strong> <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> <strong>Civil</strong><br />

tenha <strong>de</strong>ixado bens particulares, incidindo apenas sobre esses bens; (ii) a segunda, capitaneada<br />

por parte da doutrina, <strong>de</strong>fen<strong>de</strong> que a sucessão na comunhão parcial também ocorre apenas se o<br />

‘<strong>de</strong> cujus’ tiver <strong>de</strong>ixado bens particulares, mas inci<strong>de</strong> sobre todo o patrimônio, sem distinção;<br />

(iii) a terceira <strong>de</strong>fen<strong>de</strong> que a sucessão do cônjuge, na comunhão parcial, só ocorre se o falecido<br />

não tiver <strong>de</strong>ixado bens particulares. (…). É possível encontrar, paralelamente às três linhas <strong>de</strong><br />

interpretação do art. 1.829, I, do CC/2002 <strong>de</strong>fendidas pela doutrina, uma quarta linha <strong>de</strong><br />

interpretação, que toma em consi<strong>de</strong>ração a vonta<strong>de</strong> manifestada no momento da celebração do<br />

casamento, como norte para a interpretação das regras sucessórias. Impositiva a análise do art.<br />

1.829, I, do CC/2002, <strong>de</strong>ntro do contexto do sistema jurídico, interpretando o dispositivo em<br />

harmonia com os <strong>de</strong>mais que enfeixam a temática, em atenta observância dos princípios e<br />

diretrizes teóricas que lhe dão forma, marcadamente, a dignida<strong>de</strong> da pessoa humana, que se<br />

espraia, no plano da livre manifestação da vonta<strong>de</strong> humana, por meio da autonomia privada e<br />

da consequente autorresponsabilida<strong>de</strong>, bem como da confiança legítima, da qual brota a boa­fé;<br />

a eticida<strong>de</strong>, por fim, vem complementar o sustentáculo principiológico que <strong>de</strong>ve <strong>de</strong>linear os<br />

contornos da norma jurídica. Até o advento da Lei n.º 6.515/1977 (Lei do Divórcio), vigeu no<br />

<strong>Direito</strong> brasileiro, como regime legal <strong>de</strong> bens, o da comunhão universal, no qual o cônjuge<br />

sobrevivente não concorre à herança, por já lhe ser conferida a meação sobre a totalida<strong>de</strong> do<br />

patrimônio do casal; a partir da vigência da Lei do Divórcio, contudo, o regime legal <strong>de</strong> bens<br />

no casamento passou a ser o da comunhão parcial, o que foi referendado pelo art. 1.640 do<br />

CC/2002. Preserva­se o regime da comunhão parcial <strong>de</strong> bens, <strong>de</strong> acordo com o postulado da<br />

auto<strong>de</strong>terminação, ao contemplar o cônjuge sobrevivente com o direito à meação, além da<br />

concorrência hereditária sobre os bens comuns, mesmo que haja bens particulares, os quais,<br />

em qualquer hipótese, são partilhados apenas entre os <strong>de</strong>scen<strong>de</strong>ntes. Recurso especial<br />

improvido” (STJ, REsp 1.117.563/SP, 3.ª Turma, Rel. Min. Nancy Andrighi, j. 17.12.2009,<br />

DJe 06.04.2010).<br />

Esse entendimento superior foi sucedido por outros, <strong>de</strong> mesma relatoria, instaurando gran<strong>de</strong><br />

polêmica na doutrina e na jurisprudência brasileiras. Seguindo esse caminho, cabe <strong>de</strong>stacar: “Cinge­se a<br />

controvérsia a <strong>de</strong>finir se o cônjuge supérstite, casado com o falecido pelo regime da comunhão parcial<br />

<strong>de</strong> bens, concorre com os <strong>de</strong>scen<strong>de</strong>ntes <strong>de</strong>le na partilha dos bens particulares. No regime da comunhão<br />

parcial, os bens exclusivos <strong>de</strong> um cônjuge não são partilhados com o outro no divórcio e, pela mesma<br />

razão, não o <strong>de</strong>vem ser após a sua morte, sob pena <strong>de</strong> infringir o que ficou acordado entre os nubentes<br />

no momento em que <strong>de</strong>cidiram se unir em matrimônio. Acaso a vonta<strong>de</strong> <strong>de</strong>les seja a <strong>de</strong> compartilhar<br />

todo o seu patrimônio, a partir do casamento, assim <strong>de</strong>vem instituir em pacto antenupcial. O fato <strong>de</strong> o<br />

cônjuge não concorrer com os <strong>de</strong>scen<strong>de</strong>ntes na partilha dos bens particulares do <strong>de</strong> cujus não exclui a<br />

possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> qualquer dos consortes, em vida, dispor <strong>de</strong>sses bens por testamento, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> que<br />

respeitada a legítima, reservando­os ou parte <strong>de</strong>les ao sobrevivente, a fim <strong>de</strong> resguardá­lo acaso venha a<br />

antes <strong>de</strong>le falecer. Se o espírito das mudanças operadas no CC/2002 foi evitar que um cônjuge fique ao<br />

<strong>de</strong>samparo com a morte do outro, essa celeuma não se resolve simplesmente atribuindo­lhe participação<br />

na partilha apenas dos bens particulares, quando houver, porque po<strong>de</strong>m eles ser insignificantes, se<br />

comparados aos bens comuns existentes e amealhados durante toda a vida conjugal. Mais justo e<br />

consentâneo com a preocupação do legislador é permitir que o sobrevivente her<strong>de</strong>, em concorrência com<br />

os <strong>de</strong>scen<strong>de</strong>ntes, a parte do patrimônio que ele próprio construiu com o falecido, não lhe tocando<br />

qualquer fração daqueles outros bens que, no exercício da autonomia da vonta<strong>de</strong>, optou – seja por não<br />

ter elegido regime diverso do legal, seja pela celebração do pacto antenupcial – por manter<br />

incomunicáveis, excluindo­os expressamente da comunhão” (STJ, REsp 1.377.084/MG, 3.ª Turma,<br />

Rel. Min. Nancy Andrighi, j. 08.10.2013, DJe 15.10.2013)<br />

Todavia, a questão foi julgada pela Segunda Seção do Tribunal da Cidadania no ano <strong>de</strong> 2015,<br />

consolidando­se a posição majoritária da doutrina, no sentido <strong>de</strong> que a concorrência do cônjuge, no

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