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Manual de Direito Civil - Flávio Tartuce - 7ª Ed. - 2017

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<strong>Manual</strong> <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> <strong>Civil</strong><br />

ou medida <strong>de</strong> amparo curatelar. A nomenclatura correta <strong>de</strong>ve ser <strong>de</strong>finida na tramitação da citada proposição<br />

legislativa.<br />

Constata­se que o citado Estatuto altera o art. 1.768 do Código <strong>Civil</strong>, <strong>de</strong>ixando <strong>de</strong> mencionar que “a<br />

interdição será promovida”, e passando a enunciar que “o processo que <strong>de</strong>fine os termos da curatela <strong>de</strong>ve ser<br />

promovido”. O gran<strong>de</strong> problema é que esse dispositivo material foi revogado expressamente pelo art. 1.072,<br />

inciso II, do CPC/2015. Sendo assim, a norma ficou em vigor por pouco tempo, entre janeiro e março <strong>de</strong> 2016,<br />

quando o Estatuto Processual passou a ter vigência.<br />

Pensamos que será necessária uma nova norma, no caso o PL 757/2015, fazendo com que o dispositivo do<br />

EPD volte a vigorar, afastando­se esse primeiro atropelamento legislativo. Até que isso ocorra, uma alternativa<br />

viável para fazer prevalecer o espírito do Estatuto é a utilização das suas regras com alento doutrinário na<br />

Convenção <strong>de</strong> Nova York, tratado internacional <strong>de</strong> direitos humanos que tem força <strong>de</strong> Emenda à Constituição.<br />

De qualquer modo, reafirme­se que só a edição <strong>de</strong> uma terceira norma apontando qual das duas <strong>de</strong>ve<br />

prevalecer não basta, pois o Novo CPC é inteiramente estruturado no processo <strong>de</strong> interdição, como se nota do<br />

tratamento constante entre os seus arts. 747 a 758. Sendo assim, parece­nos que será imperiosa uma reforma<br />

consi<strong>de</strong>rável do CPC/2015, <strong>de</strong>ixando­se <strong>de</strong> lado a antiga possibilida<strong>de</strong> da interdição, substituindo­a pelos termos<br />

antes propostos. A propósito da superação <strong>de</strong>sse tradicional mo<strong>de</strong>lo, pontua Paulo Lôbo que “não há que se falar<br />

mais <strong>de</strong> ‘interdição’, que, em nosso direito, sempre teve por finalida<strong>de</strong> vedar o exercício, pela pessoa com<br />

<strong>de</strong>ficiência mental ou intelectual, <strong>de</strong> todos os atos da vida civil, impondo­se a mediação <strong>de</strong> seu curador. Cuidarse­á,<br />

apenas, <strong>de</strong> curatela específica, para <strong>de</strong>terminados atos”. 212<br />

Feitas tais consi<strong>de</strong>rações fundamentais, e voltando ao art. 1.767 do Código <strong>Civil</strong>, o seu inciso I expressava<br />

aqueles que, por enfermida<strong>de</strong> ou <strong>de</strong>ficiência mental, não tivessem o necessário discernimento para os atos da vida<br />

civil, tendo sido alterada, pois equivalia ao art. 3.º, inciso II, da própria norma material, ora revogado. Agora<br />

passou a mencionar as pessoas que por causa transitória ou <strong>de</strong>finitiva não pu<strong>de</strong>rem exprimir vonta<strong>de</strong>, tidas como<br />

relativamente incapazes no novo sistema. Como consequência, foi revogado o inciso II do art. 1.767, que aludia<br />

aos últimos. Continuam po<strong>de</strong>ndo ser citadas as situações dos surdos­mudos, que não têm qualquer condição <strong>de</strong><br />

exprimir sua vonta<strong>de</strong>, e das pessoas que se encontram em coma profundo.<br />

Os ébrios habituais (alcoólatras viciados) e os toxicômanos (viciados em tóxicos) igualmente são<br />

interditados por força do art. 1.767, inciso III, do Código <strong>Civil</strong>, ora alterado, pois não há mais a previsão a<br />

respeito das pessoas com <strong>de</strong>senvolvimento reduzido.<br />

Também não se interditam mais os excepcionais sem completo <strong>de</strong>senvolvimento mental, caso do acometido<br />

por síndrome <strong>de</strong> Down, tendo sido revogado o art. 1.767, inciso IV, do CC.<br />

Julgado anterior do Superior Tribunal <strong>de</strong> Justiça, do ano <strong>de</strong> 2014, enten<strong>de</strong>u que essa previsão englobaria o<br />

sociopata, que também po<strong>de</strong>ria ser interditado: “a possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> interdição <strong>de</strong> sociopatas que já cometeram<br />

crimes violentos <strong>de</strong>ve ser analisada sob o mesmo enfoque que a legislação dá à possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> interdição –<br />

ainda que parcial – dos <strong>de</strong>ficientes mentais, ébrios habituais e os viciados em tóxicos (art. 1.767, III, do<br />

CC/2002). Em todas essas situações o indivíduo tem sua capacida<strong>de</strong> civil crispada, <strong>de</strong> maneira súbita e<br />

incontrolável, com riscos para si, que extrapolam o universo da patrimonialida<strong>de</strong>, e que po<strong>de</strong>m atingir até a sua<br />

própria integrida<strong>de</strong> física, sendo também ratio não expressa, <strong>de</strong>sse excerto legal, a segurança do grupo social,<br />

mormente na hipótese <strong>de</strong> reconhecida violência daqueles acometidos por uma das hipóteses anteriormente<br />

<strong>de</strong>scritas, tanto assim que, não raras vezes, suce<strong>de</strong> à interdição, pedido <strong>de</strong> internação compulsória. Com igual<br />

motivação, a medida da capacida<strong>de</strong> civil, em hipóteses excepcionais, não po<strong>de</strong> ser ditada apenas pela mediana<br />

capacida<strong>de</strong> <strong>de</strong> realizar os atos da vida civil, mas, antes disso, <strong>de</strong>ve ela ser aferida pelo risco existente nos estados<br />

crepusculares <strong>de</strong> qualquer natureza, do interditando, on<strong>de</strong> é possível se avaliar, com precisão, o potencial <strong>de</strong><br />

autolesivida<strong>de</strong> ou <strong>de</strong> agressão aos valores sociais que o indivíduo po<strong>de</strong> manifestar, para daí se extrair sua<br />

capacida<strong>de</strong> <strong>de</strong> gerir a própria vida, isto porque a mente psicótica não pendula entre sanida<strong>de</strong> e <strong>de</strong>mência, mas há<br />

perenida<strong>de</strong> etiológica nas ações do sociopata” (STJ, REsp 1.306.687, 3.ª Turma, Rel. Min. Nancy Andrighi, j.<br />

18.03.2014). Todavia, com as mudanças ocorridas no sistema, esse entendimento parece ter caído por terra,<br />

<strong>de</strong>vendo tais pessoas ser consi<strong>de</strong>radas plenamente capazes para o <strong>Direito</strong> <strong>Civil</strong>, em especial para os atos<br />

existenciais familiares.<br />

Aliás, aqui po<strong>de</strong> ser feita uma crítica em relação ao novo sistema <strong>de</strong> interdição inaugurado pelo Estatuto da<br />

Pessoa com Deficiência. Isso porque não só o sociopata, como também o psicopata, anteriormente enquadrados<br />

como absolutamente incapazes, <strong>de</strong>veriam continuar a ser interditados ou sujeitos à curatela. Por isso, opinamos

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