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Manual de Direito Civil - Flávio Tartuce - 7ª Ed. - 2017

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<strong>Manual</strong> <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> <strong>Civil</strong><br />

intenção <strong>de</strong> prejudicar terceiros. Em havendo simulação <strong>de</strong> qualquer espécie, o ato é nulo <strong>de</strong> pleno direito,<br />

por atentar contra a or<strong>de</strong>m pública, como vício social.<br />

Apesar <strong>de</strong> esse entendimento ter prevalecido na III Jornada <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> <strong>Civil</strong>, também está longe <strong>de</strong><br />

ser pacífico. Para Cristiano Chaves <strong>de</strong> Farias e Nelson Rosenvald, a simulação inocente não po<strong>de</strong> nulificar<br />

o negócio jurídico, pois, “não havendo intenção <strong>de</strong> prejudicar a terceiros ou mesmo <strong>de</strong> violar a lei, não<br />

parece producente invalidar o negócio jurídico”. 172 No mesmo sentido pensa Sílvio <strong>de</strong> Salvo Venosa, para<br />

quem “a simulação inocente, enquanto tal, não leva à anulabilida<strong>de</strong> do ato porque não traz prejuízo a<br />

terceiros. O or<strong>de</strong>namento não a consi<strong>de</strong>ra <strong>de</strong>feito”. 173 Com o <strong>de</strong>vido respeito, não há como concordar,<br />

pois na simulação a causa da nulida<strong>de</strong> está relacionada com a repercussão social con<strong>de</strong>nável do ato, e não<br />

com a intenção das partes. A presunção <strong>de</strong> dano social, em suma, faz­se presente na simulação.<br />

Em reforço, anote­se que o atual Código <strong>Civil</strong> não reproduz o art. 103 do CC/1916, segundo o qual a<br />

simulação não se consi<strong>de</strong>raria <strong>de</strong>feito quando não houvesse intenção <strong>de</strong> prejudicar a terceiros ou <strong>de</strong> violar<br />

disposição <strong>de</strong> lei. Esta é outra razão para dizer que não há que se falar mais em simulação inocente. Esse<br />

entendimento é confirmado, entre outros, por Zeno Veloso, para quem “O Código <strong>Civil</strong> <strong>de</strong> 2002 não<br />

repetiu o preceito, não traz essa ressalva. Seja inocente ou maliciosa, a simulação é sempre causa <strong>de</strong><br />

nulida<strong>de</strong> do negócio jurídico”. 174<br />

Como foi <strong>de</strong>stacado, o art. 167 do CC/2002 reconhece a nulida<strong>de</strong> absoluta do negócio jurídico<br />

simulado, mas prevê que subsistirá o que se dissimulou, se válido for na substância e na forma. O<br />

dispositivo trata da simulação relativa, aquela em que, na aparência, há um negócio; e na essência, outro.<br />

Dessa maneira, percebe­se na simulação relativa dois negócios: um aparente (simulado) e um escondido<br />

(dissimulado). Eventualmente, esse negócio camuflado po<strong>de</strong> ser tido como válido, no caso <strong>de</strong> simulação<br />

relativa. Segundo o Enunciado n. 153 do CJF/STJ, também aprovado na III Jornada <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> <strong>Civil</strong>, “na<br />

simulação relativa, o negócio simulado (aparente) é nulo, mas o dissimulado será válido se não ofen<strong>de</strong>r a<br />

lei nem causar prejuízo a terceiros”.<br />

Completando, na IV Jornada <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> <strong>Civil</strong>, aprovou­se o Enunciado n. 293, pelo qual “Na<br />

simulação relativa, o aproveitamento do negócio jurídico dissimulado não <strong>de</strong>corre tão somente do<br />

afastamento do negócio jurídico simulado, mas do necessário preenchimento <strong>de</strong> todos os requisitos<br />

substanciais e formais <strong>de</strong> valida<strong>de</strong> daquele”.<br />

Para exemplificar, ilustre­se com o caso em que um proprietário ce<strong>de</strong> um imóvel a outrem celebrando,<br />

na aparência, um contrato <strong>de</strong> comodato. Mas, por <strong>de</strong>trás dos panos é cobrado aluguel, havendo uma<br />

locação. Aplicando a regra comentada e o teor do enunciado, o comodato é inválido, mas a locação é<br />

válida, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> que não ofenda a lei ou os direitos <strong>de</strong> terceiros e tenha todos os requisitos <strong>de</strong> valida<strong>de</strong> (art.<br />

104 do CC). Mais uma vez, com esse entendimento, há a busca pela conservação negocial, pela<br />

manutenção da autonomia privada.<br />

Em todos os casos, não há a necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> uma ação específica para se <strong>de</strong>clarar nulo o ato simulado.<br />

Assim, cabe o seu reconhecimento inci<strong>de</strong>ntal e <strong>de</strong> ofício pelo juiz em <strong>de</strong>manda que trate <strong>de</strong> outro objeto.<br />

Nesse sentido, na VII Jornada <strong>de</strong> <strong>Direito</strong> <strong>Civil</strong>, realizada em 2015, aprovou­se proposta estabelecendo que<br />

a simulação prescin<strong>de</strong> <strong>de</strong> alegação <strong>de</strong> ação própria, o que contou com o nosso apoio quando da plenária<br />

final do evento (Enunciado n. 578).<br />

Conforme as suas corretas justificativas, a simulação po<strong>de</strong> inclusive ser alegada em se<strong>de</strong> <strong>de</strong> embargos<br />

<strong>de</strong> terceiro, eis que, “com o advento do Código <strong>Civil</strong> <strong>de</strong> 2002 e o fortalecimento do princípio da boa­fé<br />

nas relações jurídicas, o ‘vício social’ da simulação passou a receber tratamento jurídico distinto daquele<br />

conferido aos <strong>de</strong>mais vícios do negócio jurídico. Diferentemente das consequências impostas aos negócios<br />

jurídicos que contenham os vícios do erro, dolo, coação, estado <strong>de</strong> perigo, lesão e frau<strong>de</strong> contra credores,<br />

os quais po<strong>de</strong>m ensejar a anulação do negócio (arts. 171, II, 177 e 182, CC), no caso do negócio jurídico<br />

simulado, a consequência será a <strong>de</strong> nulida<strong>de</strong> (arts. 167, 166, VII, 168 e 169, CC). Ocorre que ainda tem<br />

sido frequente, no âmbito dos tribunais, aplicar­se à simulação tratamento jurídico análogo àquele<br />

conferido à frau<strong>de</strong> contra credores, invocando­se, inclusive, a Súmula 195 do STJ (editada em 1997).<br />

(…). Assim, tratando­se <strong>de</strong> hipótese que gera a nulida<strong>de</strong> absoluta do negócio, aplica­se o disposto nos

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