Escritos de Saúde Coletiva
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escritos de saúde coletiva
Do ponto de vista institucional, a publicação da Norma Operacional Básica de 1993 e, em especial,
sua reedição de 1996, promoviam avanços importantes no processo de descentralização
no âmbito do SUS, ainda que limitados pelo insuficiente desenvolvimento institucional de boa
parte dos gestores estaduais e municipais e do seu desaparelhamento para exercer o poder de
controle e fiscalização que se lhes atribuía.
No entanto nem tudo estava bem no setor saúde: ao lado do retraimento do orçamento federal,
estados e municípios também estavam participando pouco dos gastos públicos com saúde – cerca
de 70% dos gastos do SUS tinham origem federal –; os baixos valores pagos aos serviços contratados
e conveniados geravam “descredenciamento branco”, isto é, médicos, especialistas, hospitais e
outros serviços de saúde, em número cada vez maior, estavam deixando de atender pacientes do
SUS; e a sobredemanda aos serviços de referência passou a impactar a qualidade do atendimento,
o que era demonstrado por recorrentes surtos de infecção hospitalar e excesso de mortalidade
(Boa Vista, Niterói, Fortaleza, Campinas): sem serviços básicos e, mesmo, de média complexidade,
sobrava às pessoas recorrerem às emergências e referências, geralmente com seus quadros clínicos
agravados ou complicados, sobrecarregando-as e sobrepassando sua capacidade instalada.
A política do governo para a Saúde, até então pouco formulada, na prática consistia no desmonte
do sistema idealizado pela Constituição de 1988. Política esta que vinha dos governos
anteriores e que, neste se fortaleceu.
Apesar da crescente necessidade de aporte de recursos para a consolidação do SUS e a ampliação
de coberturas e direitos de saúde, a resposta do governo era a redução dos recursos alocados
para o setor.
Ao lado dessa retração, a primeira administração FHC consolidou o abandono do modelo de
financiamento da Seguridade Social previsto pela Constituição de 1988, rotinizando a utilização
de receitas de contribuições sociais para a cobertura de compromissos outros do governo, inclusive
o pagamento da dívida. A ausência de uma clara definição em relação à destinação dos
recursos da Seguridade Social quanto às suas diferentes destinações, permitiu que se adotassem
conceitos elásticos, enquadrando, como financiáveis com recursos da Seguridade, um conjunto
de ações de governo (educação, pagamento de pessoal civil e inativos, por exemplo) em detrimento
das ações de saúde, previdência e assistência. À época, estimava-se que este artifício
desviava, anualmente, cerca de 20 % dos recursos que deveriam ter sido postos a disposição do
Ministério da Saúde.
Uma decorrência desta situação — além, é claro, de acelerar o sucateamento do setor — era a
permanente “queda de braço” entre os ministros da saúde e da fazenda e entre os ministros da saúde
e da previdência, onde ganhava ou o ministro politicamente mais forte ou quem administrava o caixa.
Na medida em que o pagamento da dívida se tornava a prioridade real do governo, esses mecanismos
acima apontados desviavam não apenas recursos de fonte tributária como de contribuições
sociais para aquela finalidade, em detrimento da finalidade constitucionalmente definida.
Em que pese o aumento da arrecadação das contribuições sociais e do Cofins em particular, os
repasses ao Ministério da Saúde mantinham-se inferiores às necessidades da área, situação que
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