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Escritos de Saúde Coletiva

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escritos de saúde coletiva

meio de favorecer interesses específicos. Há quem veja no vácuo provocado pela ineficiência da

democracia representativa, a explicação para a ocupação desse espaço e o crescimento do lobby (4).

Segmentos organizados da população (mulheres, negros, categorias profissionais, portadores

de determinadas patologias, consumidores etc.) têm obtido resultados positivos em sua atuação

lobista na indução de legislação favorecedora de seus interesses.

O papel do lobby no processo constituinte brasileiro de 1987-88 foi decisivo, em especial para

a conformação dos capítulos que tratam da Seguridade Social e da Saúde. Segundo Galante (4),

“durante todo o funcionamento da Assembleia Constituinte, os segmentos organizados estiveram

nos corredores e nas galerias do Congresso”.

Em sua tese sobre a representação de interesses em área de saúde na Assembleia Constituinte,

Maria Angélica Gomes (5) identificou que três grandes campos de interesses se organizaram

na Constituinte: a “coalizão reformista”, que resultou da aliança entre os movimentos sanitário,

sindical e popular e os parlamentares “progressistas” – que defendia as teses da Reforma Sanitária;

o forte lobby orquestrado pelo setor privado dependente do Estado, isto é, prestador de

serviços ao setor público, aliado aos parlamentares dos partidos mais conservadores do centro e

da direita políticos – que defendia a livre iniciativa da produção de bens e serviços de saúde e o

relaxamento dos mecanismos de regulação estatal, contrários à universalização; e os aliados do

sistema privado de atenção médica supletiva (planos de saúde), constituído de setores autônomos

do empresariado médico que não dependia da venda de serviços ao Estado – frequentemente

aliado do segundo grupo e que defendia a total autonomia do setor, sem qualquer forma

de regulação estatal. (5).

Outro exemplo prototípico da atuação de grupos de interesse no processo legislativo foi o observado

durante a proposição e apreciação de uma lei de regulamentação dos planos de saúde no

Congresso Nacional, obrigando a uma árdua negociação entre os atores sociais envolvidos: usuários,

empresários, operadoras, sistema de defesa do consumidor, governo e parlamentares, realizada

por meio da realização de doze audiências públicas e do encaminhamento de sugestões (6).

A atuação de parlamentares representantes de interesses das operadoras de planos privados

de assistência à saúde, no âmbito da comissão especial criada na Câmara dos Deputados para

apreciar as várias proposições legislativas existentes sobre a matéria, tornou-se tão agressiva que

foi cogitada a transferência da decisão para o Plenário da Casa. No Senado Federal, por outro lado,

a apreciação da matéria foi caracterizada pela intensa pressão do Poder Executivo, a favor de sua

aprovação rápida (6).

A produção da legislação que dispôs sobre os direitos das pessoas portadoras de transtornos

mentais e redirecionou o modelo assistencial em saúde mental 10 , dando conteúdo normativo

à Reforma Psiquiátrica no Brasil, foi outro exemplo de situação de extrema conflituosidade presente

na sociedade brasileira em relação a uma determinada matéria e, em decorrência disso, de

10 Lei nº 10.216, de 6 de abril de 2001, que “dispõe sobre a proteção e os direitos das pessoas portadoras de transtornos

mentais e redireciona o modelo assistencial em saúde mental”.

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