Escritos de Saúde Coletiva
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coleção de estudos do Doutor Luiz Carlos P. Romero
O papel da propaganda na promoção do uso e do abuso de álcool
A principal tática com vistas à redução da demanda por bebidas alcoólicas consiste na proibição
– ou pelo menos a restrição – da promoção e da publicidade daqueles produtos. Não foi outra
a intenção do constituinte de 88 quando dispôs que a propaganda comercial de tabaco, bebidas
alcoólicas, (...) medicamentos, (...) estará sujeita a restrições legais34.
Essa questão da restrição ou proibição da publicidade de bebidas alcoólicas e tabaco permanece
na ordem do dia há muitos anos, com defensores e opositores ferrenhos, em embate acalorado.
Os argumentos arregimentados contra e a favor da medida são de natureza tanto filosófica quanto
prática. Mesmo os que buscam bases empíricas, não concordam plenamente sobre a influência da
propaganda sobre a iniciação e o uso de bebidas e tabaco, em especial sobre crianças e adolescentes.
Os principais argumentos filosóficos contra a propaganda de álcool e tabaco estão baseados
na suposição de que ela é eficaz para promover o uso entre crianças e adolescentes e que eles não
dispõem de condições para bem avaliar e defender-se das mensagens enganosas da publicidade.
Cabe aos adultos, pais, professores e autoridades, protegê-los e decidir por eles.
A posição contrária, favorável à liberdade de propaganda, se baseia em princípios muito caros
ao liberalismo: o de que uma sociedade liberal normalmente deixa as pessoas tomarem suas
próprias decisões, por mais insensatas que sejam, providenciando para que sejam informadas da
natureza dos riscos que estão correndo e, as que queiram correr o risco, paguem por suas decisões.
Ainda assim, boa parte desse grupo reconhece que esse princípio não se aplica às crianças
que nem têm condições de corretamente avaliar os riscos que estão correndo nem bem podem
ser responsabilizadas pelas consequências de seus atos. Assim, mesmo entre os que defendem a
liberdade para a propaganda poucos defendem a promoção de álcool e cigarros dirigida a menores.
Os argumentos de natureza técnica se baseiam em estudos que buscam explicar os fatores
que influenciam o uso de cigarros e álcool. Nos Estados Unidos, muitos estudos (11) têm mostrado
que os fatores chaves responsáveis pelo uso de tabaco por jovens, por exemplo, são a influência
dos seus pares (colegas, turma) e da família. Outros, no entanto, realizados pelo próprio governo
americano, confirmaram “a influência dominante da publicidade em persuadir adolescentes a
fumar” (12). A tentativa de explicar porque o uso de tabaco estava diminuindo entre adolescentes
negros enquanto aumentava entre brancos encontrou que havia muito mais restrição ao uso e
controle por parte das famílias negras que das brancas, que os adolescentes negros dispunham
de menos dinheiro para comprar cigarros regularmente, que praticavam muito mais esportes ao
ar livre que os brancos e que consideravam fumar tabaco “coisa de branco”. (13)
A indústria tabaqueira, no entanto, não tem tantas dúvidas: não apenas aumentou em mais
de 20% seus gastos totais com publicidade, nos Estados Unidos, entre 1990 e 94, como passou a
dirigir de 7,7%, em 1990, a 25,8%, em 1994, desse montante para a promoção de seus produtos
entre crianças e adolescentes (14).
34 Constituição Federal. art. 220, § 4º.
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