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Escritos de Saúde Coletiva

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coleção de estudos do Doutor Luiz Carlos P. Romero

travam insuficientes para assegurar uma adequada proteção aos direitos em causa e, inclusive,

muitas vezes supunham uma regulamentação específica sobre transplantes.

Os países subdesenvolvidos vivem uma situação similar, ainda que, na maioria dos casos, existam

leis especiais sobre a matéria, pois essas leis têm, em geral, caráter penal e buscam, principalmente,

reprimir o tráfico e o comércio de órgãos, mas regulamentam incipientemente questões

como definição de morte, consentimento, formas legalmente válidas de manifestação da vontade

e registros de doadores. Em decorrência, o transplante de órgãos se faz sem um referencial

legal claro.

Em relação a esses conflitos e dificuldades – que a legislação especial sobre a matéria tem

buscado dirimir – muito bem expressou-se o professor espanhol Angoitia Gorostiaga: “com efeito,

as extraordinárias utilidades que cabe derivar do cadáver humano levaram a considerar que,

no conflito entre o respeito a sentimentos caracterizados fundamentalmente pelo atavismo e

irracionalidade e a obtenção e aproveitamento de bens de natureza escassa e preciosa, deveria

impor-se uma racionalidade que aconselha o sacrifício daqueles sentimentos em proveito de logros

extraordinariamente beneficiosos para os vivos”(4).

Entre os tópicos cuja regulamentação legal e implementação resultou polêmica estão o conceito

de morte encefálica, as formas legalmente válidas de manifestar e fazer valer a vontade de

doadores e não-doadores, o significado e os direitos de doadores e familiares em relação à doação,

a remuneração do doador e o comércio de órgãos, os valores culturais e religiosos relativos à

integridade e à pureza do cadáver refletidos na legislação penal, entre outros.

O escopo deste estudo é apresentar e discutir alguns desses tópicos. Seu objetivo é mostrar

como os diferentes países regulamentaram legalmente o direito de doação, a forma de doar e de

manifestar consentimento à doação e o direito dos parentes relativos à disposição do cadáver e

restringe-se, apenas, à doação e ao transplante post mortem (de tecidos, órgãos e partes do corpo)

e não à doação intervivos.

O direito de doar

É universal o reconhecimento do direito do indivíduo a determinar o destino de seu cadáver,

contra a vontade de qualquer outra pessoa. Este é não apenas um valor jurídico, mas cultural: em

todas as culturas, é inerente ao respeito e ao culto aos mortos o cumprimento inquestionável de

suas últimas determinações, entre as quais a disposição de seu espólio.

Assim, tanto na doutrina como na jurisprudência dos vários países estudados, é reconhecido

sempre o direito e a prevalência da vontade do finado em relação à disposição de seus restos

mortais. Em decorrência, todos os países que possuem legislação especial sobre doação e transplante

de órgãos reconhecem o direito de seus cidadãos maiores e capazes de doarem ou não

– conforme sua vontade e convicções – órgãos, tecidos e partes de seu corpo, após sua morte.

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