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Escritos de Saúde Coletiva

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escritos de saúde coletiva

reconhece um direito próprio aos parentes, suscetível de abranger poderes de disposição relativamente

ao cadáver, frente ao silêncio do potencial doador relativo a sua vontade de doar ou de

opor-se a doar seus órgãos depois de morto.

As leis italiana, dinamarquesa e sueca – que adotam uma solução as vezes denominada “da

indagação” – conferem aos familiares não o direito de manifestar-se em lugar do falecido ou de

autorizar ou não a remoção de órgãos, mas o de ser-lhes permitido apenas oporem-se à remoção,

se tal intervenção for considerada incompatível com as concepções do morto e sua família.

Nessa fórmula, o papel dos familiares é entendido como o de testemunhos válidos da vontade

da pessoa falecida, mas não como podendo substituir essa vontade pelas suas. Em outros

países (Portugal, Espanha), no entanto, a validade do testemunho de familiares sobre a vontade e

disposições do morto tem sido questionada como uma forma absolutamente incontrolável, por

permitir que parentes substituam a vontade do morto pela sua.

A decisão a tomar

Os parlamentares brasileiros têm em mãos uma decisão difícil a tomar, determinada pela

necessidade de apreciação, pelo Congresso Nacional, da Medida Provisória nº 1.718/98, que, na

prática, substitui o princípio do consentimento presumido pelo reconhecimento do direito subsidiário

de determinados familiares a determinar sobre a remoção ou não de órgãos e tecidos, na

ausência de manifestação de vontade do falecido.

A decisão é, basicamente, entre três alternativas: 1ª) manter o princípio de consentimento

presumido, na forma que a lei em vigor lhe dá, rejeitando a medida provisória; 2ª) “enfraquecer” o

princípio, permitindo aos parentes que se oponham à retirada dos órgãos na ausência – e apenas

na ausência – de manifestação expressa da vontade do morto, feita em vida; ou 3ª) passar a adotar

o princípio do consentimento afirmativo.

É sempre bom lembrar que estamos tratando aqui da doação de órgãos de cadáveres

de pessoas maiores de idade, que decidiram quanto a isso em pleno gozo de suas faculdades

mentais e de seus direitos. No caso de menores e pessoas juridicamente incapazes, permanece

vigendo a solução dada pela lei, isto é, a retirada post mortem de tecidos e órgãos para transplante

e terapêutica só poderá ser feita desde que permitida expressamente por ambos os pais ou

responsáveis legais.

Manter o princípio da doação presumida “forte” significa que – definitivamente – assume-se

que: 1º) a ausência de manifestação expressa de oposição à doação é forma legal e culturalmente

válida de consentimento, não estando – de nenhuma forma – condicionada, quer à averiguação

de veracidade quer à autorização da família; 2º) não é reconhecido, à família ou a qualquer

outra pessoa, qualquer direito subsidiário de decisão em relação à retirada ou não de órgãos do

cadáver; 3º) a retirada de órgãos de cadáver sem consulta à família, resguardadas as disposições

legais, constitui procedimento ético, nos moldes do que dispõe o artigo 43 do Código de Ética

Médica que veda ao médico, como conduta antiética, “descumprir legislação específica nos casos

de transplantes de órgãos ou tecidos”.

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