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Escritos de Saúde Coletiva

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escritos de saúde coletiva

O princípio a ser considerado em relação à essa questão é o de que quanto maiores forem as

exigências formais, menor será a disponibilidade de órgãos para transplantes.

O direito dos parentes relativos à disposição do cadáver

Dois tópicos são objeto de soluções alternativas discordantes, seja nos textos legais, seja na

jurisprudência: a interpretação do silêncio como manifestação legalmente válida de vontade e os

direitos reconhecido aos familiares na ausência de manifestação expressa de vontade do morto.

O silêncio em vida do cidadão falecido é entendido, nas leis que adotam o princípio do consentimento

presumido, como indício legalmente válido de que ele concordava em ser doador post

mortem de órgãos. Se outra fosse a sua opinião – por incompatível com seus sentimentos e convicções

– teria tomado uma posição ativa, fazendo registrar sua oposição a ter seus órgãos extirpados.

O debate desse tema tomou relevância em Portugal e foi levado às instâncias superiores do

Poder Judiciário, do que resultou parecer do Tribunal Constitucional segundo o qual a legislação

cria o que foi denominado “um ônus de zelo” por parte do potencial doador, “colocando-o na

posição de ter de tomar, em vida, as providências necessárias para que a sua posição se torne

conhecida antes do momento de sua morte”.(2)

A vantagem da adoção da doação presumida para aumentar o número de órgãos disponíveis

é exatamente essa: a vontade do cidadão é respeitada, ao mesmo tempo em que a passividade,

a indecisão ou a impossibilidade de alcançar os parentes não detém o transplante, no caso em

que o falecido não providenciou o registro oposição à doação. Do ponto de vista do doador, não

favorece a omissão: os omissos são, automaticamente, doadores.

No entanto, críticas fervorosas têm sido arregimentadas contra essa posição, consistindo, basicamente,

na não aceitação do silêncio como manifestação tácita de consentimento. Esse debate

não se limita aos países cuja legislação adota o princípio da doação presumida; nos países em que

se adota a solução do consentimento afirmativo, são frequentes os casos de pessoas que morrem

sem terem registrado sua posição a favor ou contra a doação.

Os argumentos naquele sentido são de que o silêncio pode representar, mais do que concordância,

indiferença em relação ao assunto, ou ausência de decisão, ou relutância em tornar

pública essa posição. Alguns veem, ainda, falta de legitimidade em impor a uma pessoa a manifestação

de sua vontade. Direitos todos esses reconhecidos como legítimos, para além do dever

de solidariedade e das necessidades sociais de órgãos para transplante.

Em vários países, como no nosso meio, acresce-se a isso a crítica de que a solução do consentimento

presumido se favorece da situação de ampla desinformação de nossas populações mais

pobres e do desconhecimento da lei.

De qualquer forma, defensores e opositores do “quem cala consente” concordam em que sua

adoção e implementação só devem se fazer acompanhadas de duas medidas complementares

essenciais: um esforço permanente de divulgação e informação da população sobre os avanços

da medicina, a necessidade de órgãos e as disposições legais – isto é, um apelo à solidariedade

social – e a facilitação ao máximo do processo de registro da oposição, de tal forma que se colo-

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