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Escritos de Saúde Coletiva

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coleção de estudos do Doutor Luiz Carlos P. Romero

Neste sentido – e ainda que considere que não é o tamanho da pena, mas a certeza de punição

que tem o maior poder dissuasor do crime – o substitutivo Lúcio Alcântara estabelece penas

de tal natureza que torna tais crimes inafiançáveis e resolve de maneira adequada as impropriedades

de técnica legislativa e jurídicas da lei em vigor e que dificultavam sua aplicação.

O segundo problema é o fato de que o projeto “entre em rota de colisão com todo o movimento

internacional sobre o assunto, que caminha em direção à doação voluntária”.

Ora, o princípio da doação presumida não significa doação obrigatória, e igualmente respeita a vontade

das pessoas, a menos que elas se omitam em manifestá-la e fazê-la registrar em seus documentos.

A obrigatoriedade que ele estabelece é a de que os que não querem ser doadores façam

registrar sua vontade em seus documentos – e é bom lembrar que estudos realizados pelo Ministério

da Saúde e pelo DataFolha indicam que menos de 25 % dos brasileiros não querem ser

doadores de órgãos post mortem. Neste sentido, o mecanismo proposto pela CDH/OAB/DF atinge

com obrigatoriedade – a de recorrer a um sem-número de institutos de identificação para fazer

registrar sua vontade de ser doador em seus vários documentos de identificação – um número

quatro vezes maior de pessoas.

Em relação ao “movimento internacional” cabe lembrar que a Organização Pan-americana da

Saúde reconhece que o princípio da doação presumida é considerado a estratégia mais eficaz

para prover o aumento da oferta de órgãos do que, por exemplo, o consentimento afirmativo ou

a doação por meio de carteira de doador – desde, é claro, que associado a adoção de um conjunto

de outras medidas como as previstas no substitutivo Lúcio Alcântara.

Na Europa, Áustria, Bélgica e França adotam o princípio da doação presumida.

O terceiro problema apontado é o da exigência de “uma ampla divulgação, em caráter permanente”

– o que o substitutivo Lúcio Alcântara prevê (art. 11 § único) – e o reconhecimento da

limitação deste mecanismo, “num país em que o cidadão comum não tem acesso aos meios de

comunicação”, o que é, sem dúvida, um “problema”, mas que não será diminuído pela adoção do

princípio do consentimento afirmativo.

Neste caso – como já acontece hoje em dia com a doação de sangue – o Poder Público, ONG

e demais interessados no assunto necessariamente terão de realizar campanhas periódicas de

comunicação social com o objetivo de esclarecer a população sobre “essa forma de manifestação

da vontade em vida” e estimular a adoção, dirigidas ao mesmo cidadão do mesmo “país em que o

cidadão comum não tem acesso aos meios de comunicação”.

A adoção do princípio da doação presumida apenas acresce a este problema mais um complicador:

o de informar e esclarecer às pessoas que não querem ser doadoras que, ao não tomarem

a providência de fazerem registrar sua vontade em seus documentos de identidade, estarão

abrindo mão desse seu direito.

O quarto problema consiste, na opinião das instituições citadas, em [a adoção do princípio

da doação presumida, supostamente] “colocar sob sério risco a dignidade dos despojos corporais

de um sem-número de excluídos”. Como o documento não esclarece de que forma o substitutivo

Lúcio Alcântara faz isso, não atino com as razões de tal afirmação.

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