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O Dinossauro - Ordem Livre

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O DINOSSAURO<br />

(ensaio sobre a burocracia brasileira)<br />

O Brasil é o país das certidões, dos documentos carimbados com firma<br />

reconhecida, dos "processos" tão pesados e lentamente elaborados quanto o Antigo<br />

Testamento, das filas intermináveis no suplício medieval dos ghichets. É o país onde o<br />

processo de aposentadoria de um velho e cansado funcionário, que tudo deu pelo Estado,<br />

sofre a via dolorosa de, pelo menos, 193 encaminhamentos (se devemos dar crédito a um<br />

ministro do Planejamento), antes de ser despachado em favor do beneficiário. Outro<br />

ministro certa vez apresentou, na televisão, dezenas de metros de formulários, colados uns<br />

ao lado dos outros, para ilustrar qual a documentação necessária a um processo de<br />

exportação: verdadeira jiboia destinada a estrangular o afoito que pretendeu vender ao<br />

estrangeiro soutiens de senhoras.<br />

O Brasil é um país onde o requerente tem de provar que está vivo, eis que maior<br />

crédito é dado ao atestado de óbito do que ao corpo do defunto. Certa vez, um diplomata<br />

aposentado que vivia no exterior e tinha trimestralmente de enviar ao Tesouro prova de que<br />

ainda permanecia vivo — recebeu seus proventos em janeiro e recebeu em julho; mas não<br />

conseguiu receber em abril — porque se esquecera, no segundo trimestre, de enviar o<br />

atestado necessário. Como explicar esse culto ao papelório e essa crueldade burocrática, à<br />

luz da tese de que somos essencialmente um povo bom, afetivo e cordial, e não um povo<br />

intelectual, cerebrino e amigo das letras?<br />

Vejam os seguintes casos, noticiados por um jornal do Rio, em julho de 1986:<br />

Iraci, portadora de síndrome labiríntica crônica, necessitava com urgência do<br />

medicamento argentino Tanakan, mas só o obteve após oito meses de luta. O auxiliar de<br />

almoxarife Carlos Palhares de Azevedo morreu em 1905 e seus herdeiros tentam até hoje,<br />

81 anos depois, corrigir a pensão a que têm direito. A professora universitária Maria das<br />

Graças Figueiredo da Luz, sob a proteção de leis, reivindica o direito de transferência do<br />

Rio Grande do Norte para a Bahia e hoje, nove meses depois de iniciado o processo, só<br />

conseguiu obter dezenas de assinaturas em seus documentos.<br />

Precisa-se aqui de um "cartão de leitor" com dois retratos 3x4 para se consultar um<br />

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