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O Dinossauro - Ordem Livre

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totalitárias" modernas. Inevitavelmente, na República de Rousseau, uma elite, uma pequena<br />

minoria de intelectuais ativistas organizados aparecerá para, na conquista do poder pela<br />

violência e a astúcia, invocar a Vontade Geral do povo. Se a Vontade torna-se<br />

verdadeiramente uma realidade imanente da vida social, qualquer homem suficientemente<br />

poderoso ou passavelmente velhaco pode pretender representá-la ou encarná-la, ou ser o<br />

único incumbente e responsável pela mesma. Agindo graças à sugestibilidade histérica que<br />

cria, o aventureiro político pode proclamar o carisma da sua vontade. O demagogo é dono<br />

da Vontade Geral. A única diferença então com as asserções gratuitas e a identificação<br />

majestosa de um Luís XIV com a Raison d'État será que o demagogo pode, simplesmente,<br />

conjurar as forças misteriosas de sua personalidade carismática, enquanto, como notaram<br />

tanto Burke quanto Tocqueville, sempre se encontra o rei acorrentado, pela tradição, à<br />

necessidade de invocar a unção divina para confirmar um princípio racional e abstrato de<br />

sucessão legítima ao poder.<br />

Lenine foi o primeiro grande Édipo que conseguiu matar a Esfinge política: ele<br />

concebeu sistematicamente a teoria do partido que alcança a maravilha matemática de ser,<br />

ao mesmo tempo, o todo. Mas, muito tempo antes de Lenine, Benjamin Constant já havia<br />

descoberto o verdadeiro modo de operação da Vontade Geral e de como os desejos do povo<br />

são entregues às mãos daqueles que pretendem agir em seu nome. Max Weber descreveria,<br />

mais tarde, esse tipo de liderança populista: chamou-a de "carismática". Constitui de fato<br />

uma graça mística que é, porém, muito mais frequentemente concedida pelo sombrio<br />

Príncipe deste mundo do que por Deus onipotente.<br />

A democracia pluralística não pode aceitar o conceito de Vontade Geral. Se tem<br />

que ser unânime e se a soberania está reservada à assembleia de todo o povo, então<br />

Jeremias Bentham está com a razão quando, ironicamente, salientou que nenhuma lei de<br />

qualquer estado europeu satisfaria Rousseau, exceto talvez a da República de San Marino.<br />

A democracia liberal, por definição, não tem vontade própria: só os indivíduos possuem<br />

vontade. A "vontade" do verdadeiro estado democrático é o resultado do compromisso, um<br />

vago denominador comum dos interesses transitórios e contraditórios de todos, conforme<br />

sejam interpretados por funcionários eleitos, falíveis, e por burocratas profissionais mais ou<br />

menos honestos. O fato permanece que, quando é predicada a Vontade Geral — e muito<br />

amiúde ouvimos de demagogos altos brados e apaixonados apelos ao "povo" e à "vontade<br />

do povo"! — podemos estar certos de que os fantasmas da ditadura demagógica despontam<br />

no horizonte.<br />

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