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O Dinossauro - Ordem Livre

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prática: sua experiência em Siracusa, quando tentou converter à filosofia o ditador local,<br />

Dionísio, terminou em retumbante fracasso. Aristóteles também foi preceptor de Alexandre,<br />

mas seus preceitos morais pouco efeito alcançaram sobre o comportamento do grande<br />

conquistador. A filosofia e o governo — theoria e praxis — não entram facilmente em fértil<br />

matrimônio, talvez porque o governo se envolve irremediável e inextricavelmente no<br />

mundo do coletivo, do político — que é um mundo necessariamente corrompido pelo Mal.<br />

O conflito entre as possibilidades pragmáticas, friamente consideradas pelos<br />

tecnoburocratas, e os ideais de perfeição pregados pelos intelectuais sem responsabilidade<br />

na praxis, é hoje evidente em nosso país. Encontramo-lo amiúde entre "clérigos", no<br />

sentido literal da palavra. Ouvimos por exemplo, recentemente, um alto dignitário da<br />

Esquerdigreja popular proclamar que a Revolução industrial está falida: mas esse mesmo<br />

dignitário leviano usa um automóvel para se locomover na cidade, um avião para ir a Roma,<br />

um telefone para se comunicar com seus pares, um rádio-tv para saber das notícias diárias;<br />

e, quando está com dor de barriga, recorre a técnicos especializados, providos de todos os<br />

recursos da tecnologia médica moderna, fruto da Revolução industrial. Não há muito<br />

sentido de coerência. Assim, como outro exemplo, muitos condenam a política de<br />

exportação mas afastam deliberadamente de sua consciência que essa política é imposta, de<br />

modo irresistível, pela necessidade de pagar uma gigantesca dívida criada pela conta do<br />

petróleo que move não apenas o automóvel que os transporta, mas que transporta também e<br />

fornece muitos dos limitados confortos da imensa massa de pobres pelos quais fizeram<br />

opção preferencial. Li há algum tempo, na revista inglesa The Economist, que, por ocasião<br />

da visita ao Brasil do chanceler Schmidt, um eminentíssimo membro da alta hierarquia<br />

eclesiástica, dom Paulo Evaristo Arns, em conversa particular que manteve com o estadista<br />

alemão, insistiu no sentido de que ele persuadisse a alta direção da Volkswagen a remunerar<br />

os operários do ABC paulista ao mesmo alto nível que gratifica os da matriz de Stuttgart.<br />

Schmidt teria respondido com um sorriso: "Ótima ideia, Eminência! Se isso for feito, a VW<br />

paulista fecha as suas portas e volta para a Alemanha, o que muito me ajudaria a resolver os<br />

nossos próprios problemas de desemprego..." Essa história é uma lição do que o<br />

desconhecimento das leis econômicas pode produzir de noções aberrantes em intelectuais,<br />

movidos pela pura convicção idealista, mas desprovidos da responsabilidade pragmática na<br />

conduta dos negócios públicos. Paradoxo tanto mais notável quanto, outrora, os membros<br />

da Igreja muito se orgulhavam de seu duro realismo e profundo conhecimento das misérias,<br />

opróbrios e necessidades da humana servidão.<br />

O traço característico de temperamento dos intelectuais que é seu<br />

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