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O Dinossauro - Ordem Livre

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luzes, na pureza de sua religião, na condescendência de sua moral, em seus hábitos<br />

metódicos, no apego que alimentam em relação ao vício, não creio que eles vejam seus<br />

chefes como tiranos, mas antes como tutores." Em artigo no Nouvel Observateur (1985),<br />

Jacques Julliard assinala que "Tocqueville aí se revela, antes de Ostrogorski, Michels e<br />

Weber, como o primeiro grande crítico da burocracia moderna; e nos apresenta essa<br />

'servidão dosada, suave e pacífica' que poderia combinar-se com algumas das formas<br />

exteriores da liberdade, de modo que não seria impossível estabelecer-se à própria sombra<br />

da soberania do povo'. Visão profética, genial mesmo. Que são, pois, nossas modernas<br />

democracias senão uma espécie de 'compromisso entre o despotismo administrativo e a<br />

soberania popular'?"*<br />

Tocqueville acentua ainda, enfaticamente, como o novo regime democrático, longe<br />

de favorecer o desenvolvimento da liberdade individual, proporcionou o crescimento do<br />

poder estatal centralizador. Tocqueville é sem dúvida o primeiro pensador que caracterizou<br />

concretamente o antagonismo entre o puro "democratismo" e o conceito de liberdade.<br />

Escreve ele (op.cit.): "Por debaixo da superfície aparentemente caótica, se desenvolvia um<br />

poder vasto e altamente centralizado que atraía para si e moldava num todo orgânico todos<br />

os elementos de autoridade e influência que até então se encontravam dispersos entre uma<br />

multidão de poderes menores e não coordenados... Nunca desde a queda do Império romano<br />

o mundo contemplou um governo tão altamente centralizado". Tocqueville salienta, desde<br />

logo, que foram o aumento da burocracia estatal, juntamente com sua crescente ineficiência<br />

e corrupção, muito mais que as guerras, os magníficos palácios e o luxo da corte que<br />

determinam o colapso financeiro da França, motivo imediato da Revolução. Versailles e as<br />

aventuras bélicas dispendiosas arruinaram, sem dúvida, o final do reino de Luís XIV. Mas a<br />

segunda metade do século XVIII foi relativamente pacífica e Luís XVI não se excedeu em<br />

construções extravagantes. A estrutura econômica do país era basicamente saudável. O que<br />

estava acontecendo é que um número realmente excessivo de indivíduos da nobreza e da<br />

burguesia mamavam nos úberes fartos do Tesouro. O Estado se depauperava. A França<br />

estava falida.<br />

O exame dos vícios do Ancien Régime francês é importante para nós quando nos<br />

lembramos que os filósofos enciclopedistas que prepararam a Revolução não criticaram as<br />

"estruturas obsoletas", tanto pela opressão que impunham, quanto pela sua irracionalidade.<br />

Verificava-se, então, como se verifica na burocracia brasileira, que toda decisão<br />

governamental era sempre tomada numa base de interesse pessoal. Não se tratava tanto de<br />

* Transcrito no Caderno Cultura de O Estado de S. Paulo, 7-7-85<br />

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