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O Dinossauro - Ordem Livre

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que devemos a tese em A República — um sintoma da decadência espiritual da sociedade<br />

poluída pela ideologia (doxa). O filósofo, que é o defensor da verdade, da justiça e da<br />

virtude, existe em oposição ao sofista e enquanto protege aretê, a virtude. Age o sofista,<br />

simplesmente, como um técnico intelectual privado de qualquer critério de valor. Para ele,<br />

simplesmente, equivaleria aretê ao sucesso ou à virtù do homem da Renascença. Por isso<br />

cabe ao filósofo resistir à poluição ideológica que tudo penetra e tudo contamina sob o<br />

efeito desagregador de sua sedução diabólica. Platão sugere que o conflito terminaria no<br />

martírio de Sócrates, muito embora seu sacrifício asseguraria o triunfo da filosofia na polis<br />

corrompida de Atenas. A dialética de Sócrates e de Protágoras no diálogo do mesmo nome<br />

se converte, na República, em uma oposição tremenda entre o philosophos (amante da<br />

sabedoria) e o philodoxos (amante de opiniões). O philodoxos é, em outras palavras, o<br />

sofista, o ideólogo, o mero intelectual. Ele usa esteticamente o pseudos, a mentira, para<br />

induzir a juventude em erro. No fundo, é um refinado e sofisticado mentiroso. Eric<br />

Voegelin acentua (em Order & History, III, 3, §3, 1) que o filósofo é o homem que procura<br />

resistir à corrupção provocada pelo sofisma na sociedade, ao tentar restabelecer a ordem<br />

correta da razão em sua própria alma, em oposição à psique enferma do sofista. A república<br />

é finalmente oferecida como o paradigma de uma sociedade espiritualmente bem ordenada,<br />

pela ordem da justiça que reina na alma de seus membros, em contraste com a sociedade<br />

corrupta que "é o maior de todos os sofistas". A sociedade corrupta seria assim dirigida pela<br />

comunidade de sofistas, ou o que chamaríamos hoje a intelligentsia, supremamente hábil<br />

em moldar a mente não apenas dos jovens ingênuos, mas também dos velhos caducos e<br />

ignorantes.<br />

Assinala por outro lado Werner Jaeger (Paideia, II.5) que o Protágoras representa<br />

o grande movimento de transformação educacional que conduz da sofistica à paideia<br />

socrática, o que significaria a formação da verdadeira cultura. O Sócrates platônico<br />

arrebenta a fortaleza ideológica de seus adversários e, penetrando pela névoa opaca do<br />

nefelibatismo exposto por Protágoras e seus discípulos, faz emergir a verdade de seu<br />

próprio programa pedagógico. Segundo Jaeger, o famoso diálogo descreve o debate com os<br />

sofistas como uma das batalhas intelectuais decisivas de sua época. Talvez nenhuma das<br />

outras obras de Platão supere essa, como análise penetrante do caráter das personalidades<br />

intelectualmente sedutoras, porém moralmente viciadas. Através de sua fina ironia, o<br />

filósofo elimina a paideia puramente estética da palavra e a sofismátiça erudita e pedante,<br />

sobre ambas fazendo brilhar a nova paideia austera e honesta da cultura moral, da<br />

verdadeira filosofia.<br />

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