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Ministério da Saúde<br />

que se incorpora à naturalidade dos dias. Nesse aspecto, a promoção da saúde e da nutrição é um<br />

processo conflitivo, com idas e vindas, configurando-se como uma internalidade a ser apreendida<br />

por sujeito em distintos tempos.<br />

O risco de um discurso técnico fora da compreensão sociocultural é o de “confundir” o sujeito<br />

com um objeto sem biografia, sem valores e sentimentos sobre sua comida e seu corpo. A reação<br />

do sujeito, ao tentar seguir um aconselhamento dentro do modelo racionalista da dietética pode<br />

reverter-se num cotidiano desvanecido pela perda do reconhecimento de si, ao tentar apagar seu<br />

tempo, suas mais reconhecidas sensações, pela imposição de outras, como a retirada definitiva do<br />

sal, amamentar exclusivamente por seis meses etc.<br />

Como lidar com essas questões? O receituário dietético sem o suporte social e a inserção<br />

cultural resulta no sofrimento do paciente, na descrença pelo profissional, em rupturas bruscas<br />

de valores e crenças sobre o comer. Na realidade, mudar práticas alimentares (hábitos, modos de<br />

comer) significa modificar a endocultura alimentar do paciente e mudar sensações íntimas que dão<br />

prazer ao corpo. Como é possível mudar o próprio desejo de pertencimento?<br />

As restrições alimentares podem ser compreendidas pelo ator social como valores que<br />

envolvem seu mundo, em sua própria situação biográfica. Ao tentar compreender sua necessidade<br />

biofísica, o sujeito entende suas restrições como objetos alheios a seu mundo. Desse estranhamento,<br />

o sujeito se aproxima da dieta e se afasta, como se caminhasse em círculo até incorporar outra<br />

referência, outro paladar que não o seu, mas de outros, na busca de uma nova intersubjetividade<br />

para a apreensão do mundo, em meio às dúvidas sobre o comer, num nível pré-reflexivo.<br />

Nessa experiência, a restrição alimentar do outro mostra o entendimento de sua própria<br />

vivência. O indivíduo necessita se situar, sentir-se presente em práticas que conhece, com uma<br />

estrutura imagética e um gosto revestido de símbolos. O gosto que reconhece, somado a uma nova<br />

aquisição (fast-food, por exemplo), se mescla a uma permanente e dinâmica formação de hábitos.<br />

É nesse momento que o incentivo ao consumo de alimentos regionais se insere. O resgate<br />

da sabedoria local, das práticas culinárias dos saberes, gostos e memórias alimentares. A ideia de<br />

território e cotidiano faz bem à alma para chegar ao corpo, entidade que a abriga e constitui-se de<br />

simulacro das relações cotidianas.<br />

Para o profissional de saúde, essa estratégia assinala a consciência de uma alimentação que<br />

traz objeto alimento ao sujeito da comensalidade como aparato coletivo da linguagem polissêmica<br />

da alimentação humana, mantendo, ao mesmo tempo, compromisso com os pressupostos do<br />

desenvolvimento ético, econômico e social da sociedade brasileira e mundial. Portanto, promover<br />

o consumo de alimentos regionais é expressar compromisso com a transformação da ética de um<br />

desenvolvimento humano marcado pela desigualdade racial, econômica e social do mundo atual.<br />

<br />

Está na base desta reflexão a ideia de que o ato de se alimentar é um compromisso direto<br />

com o planeta Terra, com a ética do desenvolvimento humano e com a disposição de transformar<br />

os aspectos deletérios da realidade social e econômica em equidade social e respeito.<br />

A noção sobre alimentação saudável não deve ser reduzida apenas ao corpo ou aos<br />

elementos da biologia e às dimensões físico-químicas do alimento. Em essência, a condição humana<br />

circunscreve-se à biologia, ao simbólico, ao sociocultural. Desse modo, num tempo e num espaço<br />

definidos, a alimentação e a cultura são inseparáveis.<br />

O alimento para o ser humano tem, portanto, historicidade. Com isso, criam-se, modificamse<br />

hábitos, incorporam-se outros valores que envolvem o comer. E para isso, é importante perceber<br />

a realidade, compreender as semelhanças e as diferenças dietéticas da cultura, na dimensão do<br />

indivíduo e do coletivo. Os termos regionalismo, nacionalismo, patrimonialidade são valores éticos<br />

a serem rediscutidos com os nutricionistas preocupados com o processo estruturante de uma<br />

alimentação saudável no Brasil e no mundo.<br />

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