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As serpentes e o bastão: tecnociência, neoliberalismo e ... - CTeMe

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Quadro 3. Mapa de algumas narrações tecnocientíficas dominantes e seus elementos conectivos<br />

Campos narrativos e tipo de enunciações<br />

Não podemos abrir mão de buscar o conhecimento, tanto porque faz parte da natureza<br />

humana (“não nascemos para viver como brutos” – diz Ulisses no Inferno da Divina<br />

Comédia dantesca – mas “para buscar virtude e conhecimento”), quanto porque a<br />

humanidade só sobrevive expandindo suas fronteiras e aperfeiçoando a téchne.<br />

A ciência é algo que não podemos desistir de perseguir, mas que, ao mesmo tempo, pode<br />

implicar uma violação de leis divinas ou uma alteração da ordem cósmica, levando<br />

então a terríveis castigos (Prometeu acorrentado, o exílio do Éden) ou grandes perigos<br />

(Cila e Caribdis, as Sereias de Ulisses, o abismo além das Colunas de Hércules...).<br />

O conhecimento é poder (para usar o aforismo baconiano), mas todo poder traz consigo o<br />

risco de perda de controle.<br />

Entre os poderes gerados pelo conhecimento, há uns peculiares, específicos: a capacidade<br />

de manipular a matéria, suas forças e seu comportamento, ou até prevê-lo. Junto com<br />

isso, vem também o mais inquietante dos poderes: o de transformar a vida em não-vida<br />

e, vice-versa, o não-vivo em vivo (o Golem, o homunculus dos gnósticos etc.).<br />

A ciência é produtora de conhecimento progressivamente mais confiável, robusto,<br />

universal. Ela abre novos mundos (cognitivos e físicos) para a exploração humana e gera<br />

incessantemente novidades. Esse “Novum” nos leva a enxergar cada vez mais longe (os<br />

anões nos ombros de gigantes), a poder cada vez mais (a era moderna vista como um<br />

colar de pérolas de descobertas e invenções acumulando-se de forma teleológica, gerando<br />

o progresso).<br />

Os modernos gostam de pintar sua época como caracterizada por uma ruptura, uma<br />

descontinuidade radical, revolucionária, com o passado. Nesse contexto, a ciência é o<br />

leão das descontinuidades. Ela, na lenda dos modernos, possui um surgimento (a<br />

“Revolução científica”), um método, seus heróis fundadores. Nesta narração, Aristóteles<br />

decididamente não é um “cientista”, Leonardo da Vinci ainda não, enquanto Galileu e<br />

Newton são decididamente cientistas, aliás, “criaram” a ciência moderna, apesar de que o<br />

primeiro acreditava num princípio de inércia em que o movimento dos objetos seria<br />

circular (o único perfeito, os outros tipos de motos são “contra a natureza”) e apesar de<br />

que o segundo era também um alquimista.<br />

151<br />

Elemento<br />

conectivo, topos<br />

ou letimotiv<br />

Ulisses<br />

Dédalo<br />

Fronteiras<br />

Fruto Proibido<br />

(Ícaro, Prometeu)<br />

Aprendiz de<br />

feiticeiro<br />

Golem<br />

(e Frankenstein)<br />

Novum<br />

Revolução<br />

Heróis

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