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As serpentes e o bastão: tecnociência, neoliberalismo e ... - CTeMe

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indústria, pode atuar como consultor privado ou até mesmo como homem de negócios.<br />

(Salomon, 1994: p. 40).<br />

Embora figuras de inventores-empresários já existiram (pensemos em Thomas Alva<br />

Edison ou Alexander Graham Bell), o cientista-empreendedor é quase um signo do<br />

funcionamento da <strong>tecnociência</strong> no <strong>neoliberalismo</strong>. Porque a flexibilização, a precariedade, os<br />

papéis e as normas impostos às universidades, aos cientistas, aos técnicos fazem hoje com que,<br />

mesmo quando não é um empreendedor (porque não participa dos lucros de uma empresa), o<br />

pesquisador contemporâneo é freqüentemente forçado a comportar-se e a pensar-se como um<br />

empresário de suas idéias: deve escrever projetos justificando seus interesses de pesquisas à<br />

luz de um retorno social ou econômico, deve pedir verba para ter estudantes e bolsistas, vê<br />

suas competências medidas, sua produtividade e eficiência avaliadas como numa empresa.<br />

Por isso, Craig Venter é uma figura ao mesmo tempo heterodoxa e sintomática na<br />

<strong>tecnociência</strong> contemporânea. Sua prática mostra, em ação, a perda de sentido das fronteiras<br />

entre ciência “de base” e “aplicada” e o peso que a iniciativa privada, voltada para a<br />

propriedade particular do conhecimento, tem hoje na produção científica. Venter é exemplo da<br />

mudança do centro de gravidade na direção da pesquisa, da ultrapassagem dos modelos de<br />

Vannevar Bush. Ele mostra como hoje existem figuras de cientistas “acadêmicos”, figuras de<br />

cientistas “industriais” e figuras anfíbias de profissionais autônomos da <strong>tecnociência</strong>, bio-<br />

empreendedores, info-empreendedores, especialistas na inter-relação entre conhecimento,<br />

técnicas e mercado. Ele não é apenas um cientista que decidiu se tornar empreendedor. Venter<br />

continua a participar ativamente na produção de conhecimento, a contribuir, como insider, nos<br />

debates epistemológicos e éticos de sua área de pesquisa. Também não é apenas um cientista<br />

envolvido com interesses comerciais, porque ele não se limita a ganhar dinheiro com<br />

consultorias ou vendendo as aplicações de sua pesquisa. Ele é uma figura intelectual que<br />

reivindica um regime de produção, apropriação, circulação de conhecimento com<br />

características específicas. Um regime em que, por exemplo, não é apenas a “aplicação” de um<br />

conhecimento “puro” que pode tornar-se mercadoria, mas a própria atividade de pesquisa é<br />

que se torna atividade empreendedora, criando serviços ou constituindo um “bem”.<br />

Venter representa uma das formas que assumem hoje os dispositivos de produção e<br />

apropriação do “capital científico” 50 mencionado por Bush. Não é meramente um exemplo de<br />

50 Howitt (2003) denomina o produto da pesquisa de “capital intelectual”.<br />

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