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As serpentes e o bastão: tecnociência, neoliberalismo e ... - CTeMe

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fundaram o “Comitê Pesquisa e Saúde” e se declararam a favor da anulação da lei sobre<br />

fecundação assistida porque, disseram, “aumenta os riscos de saúde para mulher”, “impede<br />

que casais estéreis possam ter filhos, mesmo quando um membro do casal possa ser pai<br />

biológico”, “proíbe a diagnose pré-implante, aumentando o risco de doenças genéticas graves”<br />

e “impede qualquer pesquisa científica, até mesmo em embriões destinados a serem perdidos”,<br />

negando “um dos maiores progressos da medicina dos últimos anos”.<br />

Diferentemente do ocorrido na Suíça, os cientistas italianos não conseguiram mobilizar<br />

a população. A formulação extremamente técnica das perguntas do referendum causou mal-<br />

entendidos e falta de interesse pelo assunto. A maioria dos italianos acabou considerando a<br />

questão como sendo de pouca relevância. Como efeito colateral, ainda hoje há um êxodo<br />

considerável de casais com problemas de fertilidade que buscam sua chance de ter filhos na<br />

Espanha e no Norte da Europa, onde a lei não é tão restritiva 223 .<br />

Os cientistas, em suma, conseguem cada vez menos ficar longe do debate ético, da<br />

propaganda, da atividade política e da visibilidade midiática. O “colégio invisível” 224 existe<br />

ainda, no sentido da existência de debates internos à ciência, de uma troca de informações<br />

técnico-científicas entre especialistas que ocorre por canais (congressos, papers, listas de<br />

discussão) menos visíveis que os dos mass media. Mas é um colégio formado por sujeitos que,<br />

cada vez mais, possuem também uma vida como “cientistas visíveis” 225 : figuras públicas,<br />

politicamente ativas não somente como cidadãos, mas como representantes de saberes-<br />

especialistas ou de instituições da <strong>tecnociência</strong>.<br />

223 Por incrível que pareça, a lei italiana atual proíbe a fecundação “heteróloga”, ou seja, aquela em que o óvulo e os<br />

espermatozóides não pertencem ambos ao casal que pretende fazer a fecundação (para alguns católicos é equivalente a<br />

um adultério). Conseqüência: se um dos pais for estéril, é proibido ter acesso à fecundação assistida. A lei também<br />

proíbe a diagnose dos óvulos, para ver se alguns são destinados a aborto por causa de defeitos genéticos.<br />

http://www.madreprovetta.org/associazione.asp. Acesso em março de 2008.<br />

224 Veja par. 1.6.<br />

225 Em 1975, Rae Goodell escrevia um livro intitulado The Visible Scientist (Boston: Litte Brown Ed.), no qual<br />

analisava os casos de quarenta cientistas importantes que se tornaram também figuras públicas e advogados de<br />

determinadas causas (a paz, o desarmamento, o uso da vitamina C, a luta contra a “bomba populacional” etc). No<br />

entanto, a autora avaliava que estas figuras eram uma raridade e que se tornar públicos não ajudava os cientistas em<br />

suas carreiras. Ao contrário, aqueles que faziam atividades de popularização ou de advocacy para alguma causa política<br />

eram vistos na comunidade científica como “poluidores” da ciência. Hoje, os visible scientists podem ainda ser vistos<br />

pelos colegas como uma exceção ou como um desvio patológico dos canais normais para comunicar o conhecimento<br />

científico. Mas procurar o interesse, o apoio, a interação com o público é freqüente. E colocar-se num contexto político,<br />

descer na arena pública em casos de controvérsias se tornou uma prática quase inevitável para muitos pesquisadores das<br />

áreas de maior atenção social.<br />

234

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