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As serpentes e o bastão: tecnociência, neoliberalismo e ... - CTeMe

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comerciantes” de que se orgulhava a Royal Society em seu manifesto de fundação 208 . A rica<br />

fatia de mercado representada pela popularização (as revistas multinacionais Focus,<br />

Superinteressante, Scientific American, os networks milionários de Discovery Channel e<br />

National Geographic) revela uma demanda social para este tipo de fábula, bem como sua<br />

inserção no gigantesco nicho do infotainment 209 .<br />

Em sua face nômade, enfim, multíplice, e no double bind de seu líquen discursivo, a<br />

<strong>tecnociência</strong> do controle e da governamentalidade neoliberal parece ter predileção não<br />

somente para a língua vernácula, mas também pelos lugares onde ela surge: as praças, as<br />

empresas, as lojas, os shopping centers. A linguagem com que a <strong>tecnociência</strong> constitui sua<br />

interface pública não deve ser somente cotidiana e heróica. Deve ser também auto-irônica e<br />

interativa. O diálogo com o povo, a participação, o engajamento, a cidadania são suas palavras<br />

de ordem.<br />

A <strong>tecnociência</strong> atual possui interfaces user-friendly, como as janelas e os ícones<br />

coloridos em nossos computadores, como os softwares que auto-aprendem nossas preferências<br />

e separam o spam em nossos emails. A democracia neoliberal, em que cada vez menos<br />

eleitores de fato participam, é uma democracia eletrônica rica em interfaces e enfeites<br />

“participativos”. Os bancos acessíveis pela internet, os fundos de investimento personalizados,<br />

o mercado que diz adaptar-se sob medida aos desejos do consumidor: todos possuem, cada vez<br />

mais, aparência amigável e sistemas de “inclusão”. Todos abrem mão de empregados,<br />

empregando, gratuitamente, o tempo, a competência, o interesse, os afetos do cliente. O design<br />

dos aparatos de comunicação e controle governamental já não quer sugerir uma<br />

<strong>tecnociência</strong> soberana, inalcançável, todo-poderosa, mas a sóbria elegância de algo que<br />

está a nosso serviço, por nós modulado e manipulável: “sorria, você está sendo escutado...”.<br />

<strong>As</strong> práticas discursivas atuais e a comunicação pública operam uma politização parcial<br />

(em parte de fachada) do dispositivo tecnocientífico. Mas também indicam algo mais que a<br />

necessidade de interação e de public relations. Comunicar significa, para alguns cientistas,<br />

combater lutas para a autoridade epistêmica e o peso político num contexto onde não<br />

208 Veja capítulo 3.<br />

209 Information + entertainment, informação e diversão. É o novo gênero híbrido, e já hegemônico, da comunicação de<br />

massa: um mix de “hard news” e “histórias de interesse humano”, um cardápio mais misturado possível entre assuntos<br />

“sérios” e “fatos coloridos”, entre reportagem e fofocas, informação e show. O infotainment nasce paralelamente às<br />

grandes incorporações dos grupos que faziam informação pela multinacionais do show business (Wanrer Bros, Disney).<br />

O resultado foi o desmanche do jornalismo investigativo e “cívico”, a submissão de grandes grupos de informação aos<br />

interesses de grandes corporações, a redução extrema do pluralismo na informação. Veja Castelfranchi (2006b).<br />

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