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As serpentes e o bastão: tecnociência, neoliberalismo e ... - CTeMe

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Quadro 23. Redes, relações e informação.<br />

“REDE”<br />

• Antes: uma causa, um efeito. Agora: um efeito, muitos “fatores”, e um fator contribuindo para vários<br />

efeitos. Nos processos multi-fatoriais, não são tanto as causas que estão em jogo, quanto as<br />

probabilidades.<br />

• Antes: uma ação, uma reação; um estímulo, uma resposta. Agora: teoria do caos, teorias da<br />

complexidade, teoria das catástrofes. Uma multiplicidade de interações, de feedbacks, levando a uma<br />

resposta complexa do sistema, não calculável a partir da mera soma dos estímulos. Atratores caóticos<br />

e fenômenos emergentes limitam as possibilidades de predição e controle determinista.<br />

• Verdades se tornam perspectivas, essências se tornam existências situadas, linearidades se tornam<br />

retículos, resultados se tornam possibilidades. Processos paralelos se entrecruzam e levam a<br />

fenômenos emergentes.<br />

• Antes, o espaço dos discursos científicos verdadeiros era feito de lógicas, métodos, estruturas, causas,<br />

cujo processo era a linearidade, cuja forma era piramidal, cuja estrutura era a de uma árvore. Agora,<br />

junto com a linearidade, há paralelismos, junto com linhas há redes; os efeitos são vistos como frutos<br />

de processos multi-fatoriais. A causa é substituída por uma polifonia de moduladores.<br />

• COMPLEXIDADE (dos ecossistemas, da mente, dos sistemas sociais, das dinâmicas culturais): o<br />

sistema não se deixa reduzir a elementos constitutivos isolados. A epistémê agora permite e suscita<br />

narrativas cujos atores são sistemas-organismos em que a reação deriva de uma rede de feedbacks<br />

com o ambiente todo. O reducionismo sai de moda. Determinismo se torna uma ofensa<br />

epistemológica.<br />

• INFORMAÇÃO: se torna conceito chave e palavra de ordem conectando e atravessando os diversos<br />

estratos discursivos. Os seres vivos, as estruturas não-orgânicas, as organizações sociais: tudo e todos<br />

são objetos que funcionam por meio de redes e cuja dinâmica fundamental é baseada na troca e<br />

tradução de informação. Os seres vivos eram pensados, até o começo do século XX, como<br />

organismos que funcionavam por meio de trocas de matéria e energia comandadas e controladas por<br />

sistemas lineares e direcionais: o cérebro controla o corpo, o coração determina a circulação dos<br />

nutrientes e do oxigênio etc. Com a rede Internet, com suas interfaces, seus agentes inteligentes, com<br />

os robôs industriais e domésticos, com a Inteligência Artificial e a chegada de inúmeros tipos de<br />

cyborgs, micro e macroscópicos, entender quem é o criador e quem é o criado se torna menos óbvio.<br />

4.8 Risco, confiança, comunicação: a nova ordem no governo da <strong>tecnociência</strong><br />

Entre os lugares privilegiados e estratégicos, no fluxo tecnocientífico, para ver em ação as<br />

regras da ordem discursiva, para colocar-se na escuta das narrativas e dos ecos desses refrãos,<br />

estão as enunciações produzidas pelos governos e as instituições de pesquisa.<br />

No Reino Unido, na década de 1980, tinha sido hegemônico o movimento para a<br />

Public Undertanding of Science (compreensão pública da ciência), típico do estrato disciplinar<br />

do dispositivo: divulgar, educar, explicar para as pessoas ignorantes, para que abandonem seus<br />

medos irracionais, seus preconceitos anti-científicos e abracem a causa do progresso. No<br />

entanto, em 2000, um Comitê da House of Lords fazia o balanço dos programas de apoio à<br />

compreensão pública e concluía: só transmitir e divulgar não funcionara. Porque se os temas<br />

socialmente debatidos ligados à ciência “nunca foram tão excitantes”, por outro lado a ciência<br />

estaria vivendo agora uma “crise de confiança pública”, culminada no “fiasco da BSE” (House<br />

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