As serpentes e o bastão: tecnociência, neoliberalismo e ... - CTeMe
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fornecer recibo e prestar conta de como gastam o dinheiro que recebem 48 .<br />
Quando alguma coisa falha neste mecanismo hipoteticamente necessário em que o<br />
investimento em pesquisa daria lugar à inovação produtiva gerando então lucro, e/ou<br />
empregos, e/ou competitividade e/ou distribuição de renda, o fato é narrado como absurdo.<br />
Na Europa, a “sub-utilização” (bastante típica) dos resultados da pesquisa universitária pelo<br />
sistema industrial e produtivo não só é considerada trágica, como também é chamada de<br />
“paradoxo europeu da inovação”. Nos Estados Unidos, a “falha” (menor que na Europa, e<br />
muito menor que na América Latina) entre produção de conhecimento e sua transferência para<br />
usos produtivos se chama de “vale da morte” e é ativamente combatida com políticas que<br />
tendem a facilitar o surgimento de capital social ou financeiro capaz de permitir a<br />
transformação do “capital intelectual” gerado pela pesquisa.<br />
<strong>As</strong> universidades canadenses estão passando por uma<br />
importante mudança [...] Estão se tornando mais<br />
empreendedoras, mais inovadoras e mais<br />
dinamicamente interconectadas com as economias<br />
regionais [...] Muito do que está acontecendo pode ser<br />
capturado pela frase ‘comercialização da pesquisa<br />
universitária’. A tendência [...] é excitante e significativa.<br />
Estamos começando a sentir reais benefícios<br />
financeiros [...] Há grandes expectativas de que as<br />
universidades possam contribuir mais para [...] economia<br />
e inovação. A comercialização da pesquisa é<br />
relativamente nova para as universidades [... e] está<br />
crescendo rapidamente. O Canadá como país quer fazer<br />
bem a comercialização de sua pesquisa universitária....”<br />
(ICUR, 2002; trad. e grifos meus)<br />
Os cientistas brasileiros precisam se dedicar mais a encontrar<br />
aplicações para o conhecimento que produzem, e a utilidade<br />
faz, sim, parte da razão de ser da ciência, afirma o novo líder da<br />
maior agremiação de cientistas do país. "Essa utilização é<br />
fundamental para a sociedade compreender que ciência é<br />
importante e até para justificar os investimentos na ciência",<br />
disse à Folha o matemático Marco Antonio Raupp, eleito ontem<br />
presidente da SBPC (Sociedade Brasileira para o Progresso da<br />
Ciência). [...] Em sua defesa da inovação e da ciência aplicada,<br />
Raupp afirma que os cientistas também têm responsabilidade. "A<br />
Lei de Inovação [...] vem no sentido de estimular a área, mas<br />
qualquer pessoa com experiência também sabe que não dá para<br />
resolver a coisa por decreto", afirma. [...]<br />
Garcia, R. “Ciência precisa ter aplicação, diz presidente eleito da<br />
SBPC”, Folha de S. Paulo, 06/07/2007<br />
A força da biotecnologia nacional, com mais de 70<br />
empresas que trabalham com alteração genética e<br />
movimentam 3% do PIB, é detalhada em exposição<br />
[...] De acordo com Fernando Reinach, diretorexecutivo<br />
da Votorantim Novos Negócios, fundador<br />
e coordenador do Projeto Genoma Brasileiro, a<br />
forma como as nações vão apostar suas fichas na<br />
biotecnologia será capaz de definir sua posição na<br />
economia global. "É a chance de distribuir melhor<br />
a renda no mundo." [...]<br />
Tiago, E. “Bem-vindo ao século do genoma”, Valor<br />
Econômico, 18/1/2008<br />
48 Este caso será discutido no cap. 4.<br />
Figura 6. Ciência hoje: fragmentos de um discurso empreendedor<br />
“Pela primeira vez temos um verdadeiro plano de Governo para a ciência,<br />
tecnologia e inovação no Brasil”. Com essa afirmação, Marco Antônio Raupp,<br />
presidente da SBPC, falou em nome da comunidade científica ontem à tarde<br />
em Brasília [...] “É a grande oportunidade de termos a ciência inserida e<br />
direcionada às políticas públicas industrial, agrícola, de saúde, e dos avanços<br />
tecnológicos”, afirma Raupp. Ele destaca a relevância do estímulo proposto às<br />
empresas de base tecnológica, fundamental para a inserção da CT&I na<br />
economia. “O Governo demonstra que está consciente da necessidade de<br />
transferir para o setor produtivo os conhecimentos adquiridos nas<br />
Universidades e instituições de pesquisa, para gerar riqueza econômica e<br />
benefícios sociais”.<br />
Oliveira, F. “PAC da Ciência: presidente da SBPC vê nova fase da CT&I no<br />
Brasil”, Jornal da Ciência, 21 de novembro de 2007 (grifos meus).<br />
[...] Em que áreas da Ciência vêm ocorrendo um maior crescimento da<br />
atividade científica? Ainda que todas as áreas tenham crescido, são<br />
poucas aquelas em que dobrou o número de grupos de pesquisa.<br />
Destacam-se: Artes, Ciência Política, Educação, Educação Física,<br />
Farmácia, História, Letras e Lingüística. Estes dados deixam claro que<br />
o crescimento vem ocorrendo de forma espontânea, não tendo<br />
havido a necessária priorização de um crescimento vinculado a<br />
necessidades para o desenvolvimento científico e tecnológico<br />
comprometido com o desenvolvimento econômico. Neste sentido,<br />
recentes editais do sistema CNPq-Capes anunciam a ampliação do<br />
número de bolsas para pós-graduação e pós-doutoramento em áreas<br />
estratégicas, o que poderá em poucos anos dar uma configuração<br />
mais adequada ao sistema científico brasileiro. É preocupante o fato<br />
de termos um aumento de apenas dez para 12 grupos de pesquisa na<br />
área da Engenharia Naval e Oceânica nos últimos dez anos, sobretudo<br />
se levamos em conta a intensa atividade econômica neste setor, que<br />
envolve o transporte de minérios, produtos agrícolas, petróleo etc.[...]<br />
Souza, W. “O crescimento da ciência brasileira”, Monitor Mercantil,<br />
24/1/2008, republicado em Jornal da Ciência, 25/1/2008.<br />
A avaliação da pesquisa emergiu como uma ‘indústria de crescimento rápido’. Na<br />
maioria dos países membros da OCDE, há uma ênfase crescente sobre a<br />
accountability, bem como sobre eficácia e eficiência da pesquisa financiada pelo<br />
governo [...] O governo precisa de tais avaliações por diferentes escopos: otimizar a<br />
repartição dos recursos [...]; re-orientar seu apoio à pesquisa; racionalizar ou reduzir<br />
as organizações de pesquisa, aumentar sua produtividade etc. Para esse fim, os<br />
governos desenvolveram [...] atividades de avaliação da pesquisa na tentativa de<br />
obter ‘mais valor em troca do dinheiro’ que gastam apoiando a pesquisa...<br />
Atas do seminário internacional “The Evaluation of Scientific Research: Selected<br />
Experiences”, organizado pela Organização para a Cooperação e Desenvolvimento<br />
Econômico (OECD, 1997; trad. e grifos meus)<br />
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