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As serpentes e o bastão: tecnociência, neoliberalismo e ... - CTeMe

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informado, mas da produção de conhecimento científico. E conseguiram. O nome da nova<br />

doença foi estabelecido em co-participação com os pacientes, que rejeitaram o supostamente<br />

preconceituoso GRID (Gay Related Immunodeficiency Disease) e aceitaram AIDS. Os<br />

métodos e protocolos corretos para testar novas drogas foram negociados e estabelecidos em<br />

conjunto com as organizações de pacientes. Os grupos de pressão forçaram os médicos a<br />

repensar o método clássico do teste clínico em “duplo cego”, em que uma parte dos pacientes<br />

recebe apenas um placebo. Além disso, a Food and Drug Administration foi obrigada a<br />

acelerar a aprovação do Azt (uma das poucas drogas, na época, capazes de controlar a doença,<br />

embora com graves efeitos colaterais). Não só. Um outro remédio, a pentamidina em aerossol,<br />

útil para combater um tipo de pneumonia oportunista que podia aparecer junto com a AIDS,<br />

foi experimentado pelos próprios pacientes, já que os cientistas haviam se recusado a fazer<br />

testes. Pela primeira vez na história, os grupos de pacientes organizados conseguiram, em<br />

1989, obter que a FDA aprovasse a substância com base em dados científicos recolhidos<br />

exclusivamente por meio de uma experimentação autogerida, “community-based”<br />

(Epstein, 1995; Bucchi, 2006, p. 93 segs.). No caso da AIDS, houve uma grande diversidade<br />

de sujeitos envolvidos na construção de conhecimento considerado confiável. Para Epstein<br />

(1999), a arena de construção dos fatos não compreendeu somente imunologistas, virólogos,<br />

biólogos moleculares, epidemiólogos, médicos, autoridades da área de saúde, a mídia e as<br />

companhias farmacêuticas e biotecnológicas. Compreendeu também<br />

um movimento ativista forte e internamente diferenciado, junto com vários órgãos da<br />

mídia alternativa, incluindo a imprensa gay e publicações ativistas [...] O ponto [...] não<br />

é simplesmente dizer que a pesquisa em AIDS é fortemente politizada ou que possui<br />

uma face pública. [...] Este caso demonstra que os movimentos ativistas [...] podem<br />

em algumas circunstâncias se tornar participantes autênticos na construção do<br />

conhecimento científico – que podem (dentro de alguns limites) levar a mudanças<br />

tanto nas práticas epistêmicas da pesquisa biomédica, quanto nas técnicas<br />

terapêuticas [...] Os ativistas não conseguiram ter influência simplesmente usando<br />

seus músculos políticos [...]. Eles acharam também maneiras de apresentar a si<br />

mesmos como credíveis dentro da arena da expertise credenciada. Ao mesmo<br />

tempo, esses ativistas conseguiram mudar as regras do jogo, transformando a<br />

própria definição do que conta como credibilidade na pesquisa científica [...] (Epstein,<br />

1995: p. 408-409; trad. minha)<br />

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