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As serpentes e o bastão: tecnociência, neoliberalismo e ... - CTeMe

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véu ou um obstáculo para o sujeito de conhecimento mas aquilo através do que se formam os<br />

sujeitos de conhecimento e, por conseguinte, as relações de verdade”. <strong>As</strong> condições políticas<br />

são “o solo em que se formam o sujeito, os domínios de saber e as relações com a verdade” 178 .<br />

No entanto, continua Foucault, o Ocidente, a partir de Platão, é<br />

dominado pelo grande mito de que a verdade nunca pertence ao poder político, de<br />

que [...] o verdadeiro saber é o que se possui quando se está em contato com os<br />

deuses ou nos recordamos das coisas, quando olhamos o grande sol eterno, ou<br />

abrimos os olhos para o que se passou. [...] Um grande mito ocidental: o de que há<br />

antinomia entre saber e poder [...] Onde se encontra saber e ciência em sua verdade<br />

pura, não pode mais haver poder político. (Foucault, 1996, VFJ: p. 50-51).<br />

Por isso, o sonho dos filósofos naturais empiristas era de construir um aparato de produção de<br />

conhecimento baseado em fatos: se a política, a religião, a moral ficavam fora do laboratório,<br />

o investigador, esperavam Boyle, Hooke e seus colegas, conseguiria produzir “fatos”. Ainda<br />

hoje (Quadro 8), não há nada mais ameaçador ou infamante, para o funcionamento do<br />

dispositivo, que a alusão à possibilidade de que, por baixo dos jalecos brancos ou por dentro<br />

dos tubos de teste, ainda possa existir “política”.<br />

“Vão pensar que cientista é como político”<br />

“Pesquisadores brasileiros que trabalham com células-tronco receberam com surpresa e<br />

frustração a notícia sobre a retratação da pesquisa sul-coreana. ‘Se eles falsificaram mesmo os<br />

resultados, é gravíssimo’, disse a geneticista Mayana Zatz, diretora do Centro de Estudos do Genoma<br />

Humano da Universidade de São Paulo (USP). A pesquisa produziu uma grande expectativa mundial<br />

quanto à possibilidade do uso da clonagem terapêutica no tratamento de doenças. Uma expectativa<br />

que, agora, poderá se transformar em descrença, desconfiança e frustração. ‘Vão pensar que<br />

cientista é que nem político’, lamenta o pesquisador Marco Antonio Zago, da Faculdade de Medicina<br />

de Ribeirão Preto da USP. ‘É algo muito ruim para a ciência. Cria uma sensação de insegurança<br />

em uma área onde já há muita discussão’[...]”<br />

“Vão pensar que cientista é como político”. Em: Estado de S. Paulo, Sábado, 17 dezembro de 2005.<br />

Quadro 8. A maculada pureza da ciência<br />

178 Esta é uma das razões por que Foucault considera a noção de ideologia “muito importante e ao mesmo tempo muito<br />

embaraçosa” (Foucault, 1996, VFJ: p. 26). A ideologia deve ser problematizada, porque – ao menos “numa certa<br />

concepção do marxismo que se impôs à universidade” – ela seria uma espécie de elemento negativo através do qual “se<br />

traduz o fato de que a relação do sujeito com a verdade ou simplesmente a relação de conhecimento é perturbada,<br />

obscurecida, velada pelas condições de existência, por relações sociais ou por formas políticas que se impõem do<br />

exterior ao sujeito do conhecimento”. (Ibidem).<br />

185

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